“Crônicas do Retrocesso: A desconfiguração da Política Nacional de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas” – Por Leonardo Pinho

“Crônicas do Retrocesso: A desconfiguração da Política Nacional de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas” – Por Leonardo Pinho

Por: Leonardo Pinho – Diretor da Abrasme e do Conselho Nacional de Direitos Humanos

Na quinta feira, dia 14 de dezembro, na reunião da Comissão Intergestores Tripartite, o Ministério da Saúde em aliança com a Associação Brasileira de Psiquiatria e a Federação das Comunidades Terapêuticas, aprovou a desconfiguração da Política Nacional de Saúde Mental. Colocando novamente a centralidade nos Hospitais Psiquiátricos  (manicômios), na ampliação do financiamento e na legitimação das Comunidades Terapêuticas.

As duas crônicas abaixo foram escritas no próprio dia 14 e, no dia 15 de dezembro, após uma mensagem, o Coordenador Nacional de Saúde Mental, Quirino e Antonio Geraldo da ABP festejavam e decretavam o ACABOU.

Vitória da Vergonha – 14 de dezembro – logo após a reunião da CIT.

A Associação Brasileira da Psiquiatria (ABP) e Federação das Comunidades Terapêuticas, em aliança com o Ministro da Saúde e a Coordenação Nacional de Saúde Mental, tiveram uma vitória parcial no dia de hoje com a votação na Comissão Tripartide – CIT.

A Vitória é uma Vitória da Vergonha. As mudanças propostas vão no sentido de desconfigurar a Política Nacional de Saúde Mental, construída nos últimos 30 anos, em diversos governos de matizes ideológicas diversas e reconhecida internacionalmente como referência.

Essa Vitória só foi possível através do não debate democrático, não passando pelos Conselhos Nacionais, inclusive o de Saúde e de direitos humanos se posicionaram contrários. Só foi possível virando as costas para as mais de 2000 trabalhadoras, usuários e familiares presentes nos 30 Anos da Carta de Bauru. Só foi possível cerceando a palavra do Presidente do Conselho Nacional de Saúde na reunião da CIT, inclusive com fala desrespeitosa do Ministro. Só foi possível rasgando as decisões das Conferências Nacionais de Saúde Mental. Só foi possível sem observar a posição da PFDC/MPF.

O mais importante, só foi possível, num governo ilegítimo, num desgoverno.

A Vitória da Vergonha é o que marca para a história a ABP e a Federação das Comunidades Terapêuticas. A história os julgará, serão implacáveis ao lembrar essa triste cena na CIT.

Caneta Não é Tudo – 15 de dezembro

Ontem, após a Vitória parcial na reunião da Comissão Tripartide, Antonio Geraldo da ABP e Quirino Cordeiro, Coordenador Nacional de Saúde Mental, decretaram ACABOU. Para eles, enfim, retorna o modelo de ampliação do financiamento dos leitos em Hospitais Psiquiátricos  (manicômios) e com foco principal na psiquiatria  (leiam o pequeno texto: é tanta afirmação da psiquiatria que mais parece um problema de autoestima). Uma tentativa desesperada de uma profissão se afirmar sobre as demais.

O texto é uma ode de negação do que é uma visão moderna da administração pública e de uma visão intersetorial do cuidado e tratamento.

Quirino e Antonio Geraldo acham que ACABOU por apenas ter iniciado um processo, que por sinal, não foi feito em diálogo com os conselhos de direitos, que não dialogou com os diversos conselhos profissionais, que não respeitou as posições das Conferências Nacionais de Saúde Mental e que não realizou Audiências Públicas. Acham que porque de forma ríspida o Ministro da Saúde impediu o direito de fala do Presidente do Conselho Nacional de Saúde, irá conseguir pela canetada impor o silêncio na sociedade.

Eles não entenderam que a gestão pública não é mais um ato isolado de uns poucos gestores, ou de apenas seu grupo de interesse, elas precisam ser construídas através do diálogo e da pactuação. A sociedade é mais complexa que seu desejo de decretar o fim.

Sendo assim, Quirino e Antonio Geraldo, não será apenas com a força do lobby de interesses dos que lucram com a indústria da internação ou da caneta do Coordenador e do Ministro que vocês vão decretar: ACABOU.

Apenas começou. E mais de 30 anos de história e de reconhecimento internacional, construídos em diversos governos de matizes ideológicos diversas, não será apagado apenas pela vontade dos senhores. Haverá muita resistência, diálogos, mobilizações em amplos setores da sociedade.

Não se esqueçam: Caneta Não é Tudo!