Oxigênio – Por Edson Luiz André de Sousa

 

“VIDA NÃO TEM ADJETIVO. É uma mistura em cadinho estranho mas que me dá em última análise, em respirar. E às vezes arfar. E às vezes mal poder respirar…”

Clarice Lispector, Um sopro de vida

 

Inicio este texto com a notícia de que a Espanha, nas ultimas 24 horas registrou 832 mortos, trágico recorde de óbitos em um único dia devido ao CORONAVÍRUS.

Como nunca, o título de um livro nomeou de forma tão cristalina o que estamos vivendo neste momento. Um sopro de vida, de Clarice Lispector. Respirar, Respirar, Respirar, Respirar…buscar oxigênio lá onde ele existe, abrir janelas.

Talvez uma das imagens mais cruéis desta PANDEMIA é quando um profissional da saúde tem que escolher entre quem vai ter acesso ao respirador e quem não vai. Quando líamos, dias atrás, sobre estes dilemas que vinham, sobretudo dos relatos na Itália, ficamos todos incrédulos, já que o coronavírus evidenciava de forma abrupta o que sempre marcou grande parte da história da humanidade, a desigualdade  social.

O vírus é de todos, mas nossas respostas a ele vão dizendo do nosso lugar no mundo, de nossa posição diante da vida, de nossa condição econômica, de nossos afetos solidários.  O alerta da Organização Mundial da Saúde (OMS) para o mundo inteiro é categórico em termos da estratégia que temos que adotar para enfrentar, neste momento, esta pandemia: isolamento social. Diante do dilema “a bolsa ou a vida” não temos escolha pois ao escolher a bolsa, perdemos os dois. Como nunca temos que escutar a ciência e o que dizem de forma unânime os profissionais da saúde em dezenas, centenas de alertas que tem circulado pelo mundo inteiro, de que neste momento, não temos outro caminho, senão o de respeitarmos esta quarentena.

Os estudos são categóricos e irmos contra as evidências do conhecimento é um ato de irresponsabilidade.  A Sociedade Brasileira de Infectologia se manifestou publicamente em carta aberta no dia 24 de março, logo depois da manifestação de Bolsonaro em rede nacional, minimizando a pandemia nomeando-a como um “resfriadinho”. Reproduzo aqui alguns trechos que são contundentes, e quem sabe possa ainda funcionar de alerta a alguns que ainda continuam incrédulos e fechando os olhos para as evidências.

“Neste difícil momento de pandemia de COVID-19 em todo o mundo e no Brasil, trouxe-nos preocupação o pronunciamento oficial do Presidente da República Jair Bolsonaro, ao ser contra o fechamento de escolas e ao se referir a essa nova doença infecciosa como “um resfriadinho”.

Tais mensagens podem dar a falsa impressão à população que as medidas de contenção social são inadequadas e que a COVID-19 é semelhante ao resfriado comum, esta sim uma doença com baixa letalidade… A pandemia é grave, pois até hoje já foram registrados mais de 420 mil casos confirmados no mundo e quase 19 mil óbitos sendo 46 no Brasil. (Dado de 24 de março).

E a carta finaliza assim:

Quando o COVID-19 chega à fase de franca disseminação comunitária a maior RESTRIÇÃO SOCIAL com fechamento do comércio e da indústria não essencial, além de não permitir aglomerações humanas, SE IMPÕE. Por isso, ela está sendo tomada em países europeus desenvolvidos e nos Estados Unidos da América”

Segue no link a integra da carta .

https://www.sistemampa.com.br/noticias/sociedade-brasileira-de-infectologia-divulga-nota-apos-pronunciamento-de-bolsonaro/

Durante muito tempo a humanidade acreditou que a terra era o centro do universo, até que Copérnico, enfrentando todas as adversidades, mostrou que nada mais éramos do que mais um planeta girando em torno do sol.

Sigmund Freud sublinha este fato como uma das primeiras grandes feridas narcísicas da humanidade. As outras duas seriam as descobertas de Darwin sobre nossa origem e a dele próprio, propondo a ideia do Inconsciente. Contra estas evidências da ciência nunca haverá carreata, por mais barulhenta que seja, que fará novamente o sol girar em torno da terra.

Precisamos ir buscar oxigênio lá onde ele está. Encontrei um pouco deste ar ao ler a carta aberta dos governadores do nordeste, datada de 25 de março onde um dos itens diz: “Vamos continuar adotando medidas baseadas no que afirma a CIÊNCIA seguindo orientação de profissionais de saúde, capacitados para lidar com a realidade atual”.