Não há a menor possibilidade de levantar uma bandeira isolada ou mesmo preponderante do PT no segundo turno. O trabalho de Haddad deve ser o de montar, de forma realmente honesta, um governo de coalizão não apenas com as forças de esquerda, pelas quais já nutre proximidade programática e simpatias mútuas, mas procurar ativamente aproximar setores como Rede e parte do PSDB antibolsonarista para evitar a vitória iminente do nazi-fascismo no Brasil.
Se conseguirem passar a imagem de que o próximo governo não será apenas do PT, mas de todos os que estiverem em coalizão, como uma frente ampla e inédita contra os retrocessos do governo golpista e capaz de obstaculizar a escalada do nazi-fascismo no país, as possibilidades são amplas e muito exequíveis no segundo turno.
Tal aliança, se houver, motivará diferentes espectros a arregaçarem as mangas para que esse novo governo seja eleito. Um governo realmente popular e diverso, demonstrando a todos que a curta experiência democrática brasileira conseguiu engendrar políticos capazes de defender a democracia a todo custo e apesar de tudo.
Só tal aliança será capaz de conseguir convencer o eleitor de que as tendências petistas, pedetistas, pessebistas, da Rede, do PCdo B, do PSOL e de partes do PSDB e pouquíssimos, mas significativas figuras do PMDB, realmente farão um governo conjunto em nome da maioria da sociedade brasileira e pela democracia que poderá ser, esta sim, apunhalada.
Isso exige que o PT abra mão, desde as primeiras horas, de ser o mandante absoluto do governo e, juntamente com outros partidos e candidatos, procure convencer a população disso. Se isso ocorrer, o índice de rejeição cairá e será menos difícil convencer o eleitor indeciso, mesmo aquele que votou em Bolsonaro no primeiro turno como arma contra o PT.
Caso não ocorra, o PT terá de enfrentar as imensas dificuldades de vencer as eleições no segundo turno e, depois, de enfrentar as enormes resistências que advirão para assumir a presidência no dia 01/01/2019 (ver o artigo de Paulo Endo, em artigo anterior publicado no PPD em 02/10/2018).
Não há tempo para hesitação, o tempo é de extremos e mesmo à candidata Marina. Deve-se pedir por um ato de grandeza unilateral, que o PT não soube ter quando atuou contra sua candidatura nas eleições de 2014. Tal ato poderá, contudo, reconquistar a confiança de eleitores de esquerda de Marina que a abandonaram definitivamente, após sua pusilânime atuação nos episódios do impeachment.
Marina que, como única candidata mulher, desferiu a mais eficaz enxovalhada em Bolsonaro na frente de milhões de brasileiros durante debate entre candidatos na Rede TV; Marina que conhece profundamente a realidade dos grotões amazônicos e atuou lado a lado com Chico Mendes pelos povos da floresta. Essa Marina pode vir a compor um governo de coalizão contra o nazi-fascismo, ultrapassando rancores profundos do passado no qual o PT se comportou de modo suspeito e desrespeitoso contra sua candidatura, recebendo, em troca, o lamentável apoio que ela concedeu ao impeachment de Dilma Roussef.
Precisamos de Marina, de Ciro, de setores antibolsonaristas do PSB, do PSDB e mesmo de figuras-chave do PMDB e de todos os que neste momento acreditam na possibilidade concreta de não vivermos mais numa democracia (hoje aos pedaços) num futuro próximo.
É a união contra a calamidade e o caos. É a união para manter vivos os sonhos de um Brasil possível no futuro. É a união possível para todos aqueles que estejam dispostos a colocar os próprios narcisismos de molho em nome da preservação do sistema representativo alquebrado, e das poucas liberdades democráticas que ainda se pode usufruir no Brasil.
Não há outra possibilidade. Hesitar agora em nome de veleidades partidárias e interesses carreiristas é por tudo a perder. A competência de Haddad será demonstrada agora. Seu primeiro teste como estadista começa hoje. Será capaz de unir todas as forças anti nazi-fascistas e conclamar a todos que lutem agora, nos próximos dias, nas próximas semanas para evitar a queda? Eis o chamado!
Muitos brasileiros esperam essa sinalização de todos os candidatos para encaminharem seu voto, e os que pretendem trabalhar no segundo turno esperam essa sinalização, para reunirem argumentos suficientes para convencer as pessoas de que o próximo governo será, sobretudo, pela Democracia e contra o nazi-fascismo, e não pelo PT.
No primeiro turno, foi jogada na lata de lixo pelos partidos a possibilidade de uma coalizão que teria grandes chances de diminuir muitíssimo a ascensão do candidato nazi-fascista. Logo no início da campanha, foi cogitada a chapa Ciro-Haddad que sairia certamente vitoriosa no primeiro turno. Cedo foi descartada pelo PT. Dar-se ao luxo de, mais uma vez, jogar fora as condições que hoje permitem que haja partidos, candidatos e sistema parlamentar e representativo será a maior imbecilidade jamais vista e indicará que não há políticos à altura no país para um projeto de Brasil democrático e, doravante, navegaremos por muito tempo à deriva e sem horizontes. 20 anos mais, talvez?
Está nas mãos, primeiro, de Haddad e de seu partido, a luta para manter a democracia de pé, ainda que alquebrada, a despeito de setores de seu partido mais preocupados com a sobrevivência e a preservação do PT no poder. Mas também de cada um dos candidatos derrotados no primeiro turno que terão a oportunidade de revelar a importância que conferem ao sonho da construção de um país republicano.
Os partidos a quem foi dado o privilégio de ocuparem os cargos eletivos têm de compreender que, amanhã, sua própria existência como partido poderá estar ameaçada. Seguir com o modus operandidos partidos e seus projetos fracionados e corporativos será mergulhar a pouca chance que temos no lodo das gangues que esperam, ansiosamente, o momento para tomar conta do país.
A hora para todos e, sobretudo, para todas (que já entenderam isso), é agora e o momento é este.