Se tudo correr bem, Haddad será eleito o novo presidente do Brasil. Pesquisas recentíssimas já apontam empate técnico entre ambos a partir de um crescimento vertiginoso do candidato do partido dos trabalhadores nos últimos dias. Entretanto é mais do que necessário e plausível que se apresentem algumas possibilidades nefastas mais a frente. Sob a sombra de 2016 e a força que o candidato que incentiva crianças a fazerem mímica imitando revólveres, a eleição de Haddad deve ocorrer num contexto completamente inédito e repleto de possibilidades nefastas e tudo o que vivemos em 2016 se intensificará.
Vamos especular pendendo para o negativo, duas delas e, mais uma vez, problematizar a improvável união das esquerdas que acaba de fracassar para as eleições de 2018.
As supostas esquerdas brasileiras partidárias, ou os que decidiram portar um discurso à esquerda, como o candidato do PDT Ciro Gomes, de maneira impressionante parecem ainda não terem tomado tento do tamanho do golpe. Da facilidade com que tudo aconteceu, dos dois últimos 2 anos de ataque frontal a direitos conquistados, à prisão do presidente mais popular da história do país, do aumento da violência em boa parte dos dados de violações de direitos humanos; tudo isso acompanhado da extorsão do voto de mais de 54 milhões de pessoas além de muitas outras barbaridades impossíveis de serem enumeradas aqui, mas não menos insidiosas, como o balcão de negócios que o governo Temer exerceu de modo totalmente desavergonhado para impedir o prosseguimento de denúncias e investigações sobre ele mesmo, na prática fazendo das emendas parlamentares o caminho mais curto, legal e incentivado pelo executivo para a corrupção parlamentar. Com abuso desse mecanismo de compra e venda Temer conseguirá terminar seu mandato ilegítimo sem um arranhão, apenas escoriações leves, que valeram o preço do exercício do poder sem voto. Será condenado mais adiante? Impossível prever num Brasil em desgoverno.
Além disso vivemos a maior desmoralização da suprema corte do país, pusilânime para garantir direitos constitucionais e letárgica para permitir a um Eduardo Cunha liderar o 3o. golpe no país, além é claro, de protagonizar a conclusão do golpe com a prisão de Lula e autorizar o uso indiscriminado das delações premiadas e da operação lava jato, que após a prisão de Lula praticamente sumiram das mídias nacionais. A “lavagem” já foi feita, certo?
Soma-se a isso a maneira perigosíssima com que supremo tribunal e o executivo viraram às costas para a Comissão de Direitos Humanos da ONU. Para ser ter ideia da dimensão de tal atitude, esses tribunais que nada tem de supremo decidiram, por sua conta e risco não responderem à Declaração Universal dos Direitos Humanos lavrada em 1948.
A despeito dessa complexa trama regressiva, nada disso funcionou. O PT tem enorme possibilidade de ser uma vez mais eleito no próximo pleito, se isso é bom ou ruim, deveremos analisar com calma após as eleições porque o cenário agora, no caso da derrota de Haddad, seria desolador.
As mídias que apoiaram o golpe acompanharam com tristeza o derretimento da candidatura de Geraldo Alckmin, Henrique Meireles e Marina Silva. Chegaram a cogitar o apoio a Bolsonaro no início-único candidato anti PT vivo-, mas agora retroagem com medo, muito medo, das consequências de sua eleição para a imprensa livre caso seja eleito.
A frase mil vezes repetida por Dilma Roussef: “Prefiro o barulho da imprensa livre ao silencio da censura”e que ela levou até as últimas consequências, não duraria um dia num governo fascista.
Vamos considerar dois cenários apoiados na constatação óbvia de que as forças que articularam de maneira muitíssimo eficaz o 3o. golpe não estavam brincando de faz de conta; não realizaram tamanha façanha para ela ser revertida em 2018, com a volta do PT ao poder e já ensaiam suas estratégias.
O cenário obscuro, com a consequência imprevista de um presidente proto fascista começa a assustar as grandes mídias do país, sempre tardiamente e às vésperas do caos, é óbvio. Algumas das mídias golpistas começam a, discretamente, fazer campanha pró-Haddad. Temem certamente retroagirem ao estado de capachos de forças autoritárias do passado e a terem de justificar adiante porque apoiaram governos racistas, torturadores, homicidas etc. Uma nova mea-culpa anos depois não as salvará da incredulidade crescente em que já se encontram.
Com o candidato acusado de racismo no poder todas as instituições democráticas viverão sob constante ameaça a ser concretizada com o uso da força bruta: o judiciário, incluindo a suprema corte, a imprensa livre, os partidos de todas cores e credos, os ativistas e todos os movimentos de livre manifestação. O seu vice, general passadista, representa o descalabro do apoio renitente ao golpe de 64 e suas declarações recentes sobre isso não deixam dúvidas sobre seu mal estar diante da existência de um parlamento e um sistema representativo.
Acrescente-se a isso que a última frase do candidato que apoia a tortura é bombástica: “não aceito resultado das eleições diferente de minha eleição” é quase uma promessa e antecipa reações porque, caso não vença, o que é muito provável, deverá conclamar todos os seus signatários para a prática da violência e do inconformismo. As forças geradoras do impeachment, que ele apoiou de modo entusiástico, voltarão às ruas mas agora de modo muito mais violento, muito mais truculento e, provavelmente armados, diferentemente do que ocorreu no golpe de 2016 e parecido com o que ocorreu na caravana Lula pelo sul do país.
Com a velha bravata de destruir o PT a violência será apoiada e incentivada pelo candidato e seu vice (ambos militares) e episódios de violência podem explodir pelo país.
Para uma dupla que apoia os mais inadmissíveis ataques à democracia insuflar a violência não será nem contraditório, nem impossível. Ao contrário será a consequência natural de um processo que deu seus primeiros passos com o início do segundo mandato de Dilma Rousseff .
Michel Temer assistirá tudo pela TV, se tudo ganhar a aparência de caos, ele poderá decidir pela intervenção das forças armadas, intervenção que ensaiou diversas vezes durante seu mandato, e autorizará o 4o. golpe, prolongando indefinidamente o seu mandato.
Quanto à aparência de caos e desordem, estarão de plantão as mídias que tiveram papel central no impeachment de Dilma. E a elas, hoje, interessa mais o prosseguimento de um previsível Temer, do que de um descabido presidente que sugere implantar o golpe no primeiro dia de seu mandato.
Cenário 2
Outra possibilidade igualmente nefasta: prevendo sua derrota iminente, Bolsonaro conclamará seus adeptos a praticarem vigilância fascista já no segundo turno. Seus adeptos fanáticos poderão criar situações que inviabilizem votações em certas zonas eleitorais, em geral, completamente desprotegidas e, com o discurso de fraude, paralisará as eleições no segundo turno provocando a intervenção federal. (veja um exemplo publicado no GGN e postado no PPD ontem).
Nada hoje é mais assustador para as forças que apoiaram o golpe do que a volta dos que foram usurpados do poder, do voto e de direitos. Contra eles tudo é preferível, incluindo a permanência de Michel Temer no poder.
As forças de esquerda saberão reagir a isso? Sabem hoje que a sua desunião provocará a iminência de um quarto golpe? Consideram que a rejeição ao PT é hoje um álibi para violências fascistas a ser utilizado pelos possíveis derrotados? Estará preparada para evitar a continuidade do governo Temer?
Cenário 3
Impronunciável e, nesse momento, indo pro brejo, com o belo empurrão das mulheres no sábado.
Imagem: Manifestação #elenão. Largo da Batata, São Paulo. 2018.