Infelizmente, eu não conhecia Marielle Franco antes de sua execução. Mesmo assim, a morte dela me afetou profundamente.
Marielle transgrediu a linha que lhe era destinada. Por ser negra, pobre e favelada, estava descoberta de direitos, esperava-se que vivesse e morresse em silêncio. Mas teve voz quando viva e, depois de assassinada, continua sem se calar.
Ah, Marielle, você é barulhenta!
Marielle também era uma mulher lésbica, era socialista e socióloga. Ela transitava. Cruzou a linha do amor heterossexual, fazia política e era acadêmica.
Ah, Marielle, você é ousada!
Marielle representou. Ela não falava só por ela, falava por ela e mais 46 mil.
Ah, Marielle, você é empoderada!
Marielle foi executada.
Houve muitos que, por vício de pensamento ou má fé, tentaram fazer dela um “cadáver comum”. “Não vamos prestar atenção nisso” – disseram — “seu assassinato não conta, como o de todos os que vivem vidas periféricas.” Para justificar inventaram que ela mereceu, da mesma forma que fazem com todos os que vivem vidas periféricas.
Nada disso. Marielle só morreu porque circulava entre a periferia e o púlpito.
Ah, Marielle, você é subversiva!
Marielle continuou falando depois que morreu. Ela passou a gritar pela boca de outros.
Quando resulta de ato e não de hábito, o assassinato não extermina a eficácia simbólica — lição freudiana. Ainda não sabemos se estaremos à altura de ecoar Marielle. Mas fato é que ela tornou-se um símbolo e, como tal, balança a realidade com sua mensagem.
Ah, Marielle, você tá viva!