Publicado originalmente em Revista Lacuna
[ Fanon, Foucault, feminisms: Psychoeducation, theoretical psychology, and political change ]
por Erica Burman
Tradução | Hugo Lana
Este artigo explora algumas justaposições entre três recursos críticos que informam debates teóricos em psicologia e educação: Fanon, Foucault e feminismos. À medida que o foco é em Fanon, alinhamentos mútuos e fricções entre suas análises e os outros incitam (impelem) orientação e análise racional abrangente. Esse projeto de engajamento político busca não somente revigorar a psicologia, mas também informar ativismos psicológicos e pedagógicos. Eu, portanto, faço uso de Fanon, Foucault e dos feminismos porque eles são icônicos, fecundos e porque — como eu irei sugerir — eles enfatizam aspectos do trabalho de Fanon, como recurso crítico inspiracional que ainda pode ser suficientemente explorado.
Estratégias metodológicas, pressuposições analíticas: lendo mudanças políticas e psicoeducacionais a contrapelo
Para explicar a metodologia que informa este trabalho, o objetivo é colocar em campo análises feministas e — embora em menor extensão — foucaultianas como recursos para a leitura dos relatos de caso de Fanon. Este é a favor de uma afirmação de que qualquer teoria psicológica ou educacional compromete-se com um modelo do “psicossocial” que é político, no sentido de conceituar os constituintes e determinantes sócio-históricos do domínio da psique (individual ou coletiva)[1]. Além disso, através de uma leitura atenta dos (primariamente um dos) casos psiquiátricos de estudo de Fanon descritos em Os condenados da terra[2] (a partir daqui mencionado como “CDT”), uma reinvindicação recíproca pode ser feita de que práticas terapêuticas de (o que, em termos de Foucault, é chamado) cuidado de si ou tecnologias da subjetividade, que são compreendidas como políticas em seus efeitos, também podem ser mobilizadas de maneira transformadora assim como repressiva. Isso ilustra como o projeto psicoeducacional e psicopolítico de mobilização anticolonial foi praticado, tanto em sua clínica quanto em suas atividades políticas mais evidentes.
A noção de “psicoeducação” topicalizada aqui não somente liga psicologia e educação como também sublinha características de tecnologias e práticas pedagógicas e psicológicas, inclusive a psicoterapia. De fato, o termo “psicoeducação” é frequentemente associado aos modos de terapia psicológica que envolva a transmissão de mensagens educacionais prescritas, cujos propósitos pedagógicos (lineares) são associados com a adaptação social (especialmente, mas não somente, de mau comportamento dos jovens) assim como com terapia de grupo[3]. A noção é, entretanto, também mobilizada em relação a terapias sobre trauma e guerra[4] [5].
Claramente, juntar as perspectivas feministas, foucaultianas e fanonianas não é meramente um projeto demasiadamente ambicioso, também é um projeto destinado a fracassar. No entanto, como discutiremos, o fracasso – ou a falta de certeza – forma parte do método assim como da temática deste artigo. No lugar de uma narrativa triunfal, harmoniosa, atravessando o psíquico e o político, a terapêutica e o educacional, por meio das teorias feministas, foucaultianas e fanonianas, o aporte metodológico utilizado explora suas tensões e ambiguidades. Estas são utilizadas para convidar leituras mais aprofundadas de Fanon como parte de um projeto de elaboração da teoria crítica (e prática) em educação e psicologia.
Eu tento subverter leituras adaptacionistas de “psicoeducação” por meio da atenção às conexões entre projetos terapêuticos e sociopolíticos evidentes na prática psiquiátrica de Fanon, cuja significância apenas recentemente foi reconsiderada seriamente[6]. Essa abordagem crítica em relação à psicoeducação deve muito aos argumentos feministas e foucaultianos, em particular àqueles que demonstram o alcance de discursos pedagógicos e psicológicos fora dos contextos de educação escolar e terapêuticos para informar políticas e práticas de Estado e transnacionais[7]. A atenção à prática terapêutica de Fanon pode, eu sugiro, não somente oferecer novas perspectivas sobre Fanon, mas também sobre o projeto psicoeducacional de transformação[8] psicosocial (ou seja, social e pessoal). Enquanto os tratamentos da prática política e psiquiátrica de Fanon são geralmente separados, o foco deste artigo em uma leitura psicopolítica dos casos “clínicos” de Fanon é utilizado para argumentar tanto pela necessidade e engajamento crítico com os modos psicoterapêuticos, quanto pelas formas político-pedagógica estão conectadas.
Uma segunda característica metodológica, engajada com todos os três quadros analíticos em jogo neste trabalho, refere-se à subversão ou disruptura de noções de linearidade. Isso introduz temporalidades mais complexas, psicopoliticamente sintonizadas, mobilizadas por diversas arenas da prática política. De fato a atenção à narrativa, em vez da ordem lógica ou histórica é refletida na estrutura deste artigo. Após delinear inicialmente as ferramentas conceituais empregadas na e para a sua análise, este artigo volta-se para apresentar e então re-apresentar o relato de Fanon, de seu tratamento dos casos, oferecendo leituras adicionais e sucessivas e releituras para cuidar e explicar sua metodologia psicopolítica e psicoeducacional.
Marx e Freud como recursos de e para o psicopolítico.
Deve ser reconhecido de início que as perspectivas feministas, foucaultianas e fanonianas partilham de alguns recursos chave: Marx e Freud. Em relação a Marx, há o claro engajamento feminista de longa data. Nancy Hartsock e Susan Hekman em particular despontam como duas teóricas feministas marxistas, ao lado da crítica feminista dos modos de organização da esquerda de longa data que tem profundas implicações de processo[9]. A análise feminista socialista continua a realçar as consequências especificamente de gênero da crise econômica atual, e também como as mulheres estão sendo alvo, nas últimas estratégias do Capital, para mais financialização dos pobres (como no assim chamado “capitalismo do último bilhão” ou “bottom billion capitalism“, com o engajamento do Banco Mundial com mulheres e o microcrédito como salvadores da economia mundial[10]. Apesar de algumas afirmações recentes sobre as inclinações foucautianas neoliberais[11], ele é aceito como alguém que estrutura suas intervenções através de uma perspectiva marxista (assim como a maioria dos outros intelectuais franceses daquele tempo[12]). Similarmente, o projeto anticolonial de Fanon foi claramente formulado a partir de uma perspectiva marxista (tanto que chamá-lo de um “Lênin negro”, seria para reafirmar isto[13]). Mesmo assim ele advogava fervorosamente dos movimentos de liberação nacional e suas análises (em “A Dying Colonialism“[14] e “Os Condenados da Terra”[15], especialmente – ambos os textos serão comentados por mim) concentravam-se em construir consciência de massa política e democracia popular, assim como explicar e criticar as cumplicidades da burguesia colonial.
Sobre Freud, há também conexões grandes, senão mais complexas. Para as feministas, o slogan da segunda onda de que “o pessoal é político” afirmava como a política funciona e opera no pessoal (em vez da personalização do político, como o neoliberalismo e a psicologização o fazem). A desconstrução da fronteira entre o público e o privado, sobre a qual se sustentam argumentos como aqueles a respeito da divisão do trabalho baseada em gêneros[16], destaca a “generificação” da nação e dos modos como a regulação da sexualidade das mulheres tem sido centrais para identidades culturais e nacionais[17]. Tais desconstruções dos binários público/privado, doméstico/nacional também iluminam como os modelos de violência de gênero tanto implicam como garantem configurações específicas das relações entre segurança nacional e transnacional[18]. A despeito de muitas e várias críticas feministas a Freud e a psicanálise, há um comprometimento comum de levar a sério os modos em que a subjetividade é moldada, formada e impactada pela experiência; e relativa às condições internas assim como às externas para, incluindo obstáculos e resistências, mudar.
A relação foucaultiana com a psicoterapia e a psicanálise é equivalentemente complicada. O projeto terapêutico prefigurado pela confissão foi central para a prática moderna do biopoder. Ainda assim, na História da Sexualidade[19], por exemplo, Foucault garante um lugar para a psicanálise. Seu foco em elaborar as condições históricas e materiais para modos (ou tecnologias) particulares de subjetividade[20] inspirou análises do colonialismo que também estão esboçadas em Fanon[21]. De fato, ao elaborar um modelo de poder como uma relação “exercitada a partir de pontos inumeráveis”[22], Foucault estava necessariamente se engajando com as reverberações e ressonâncias complexas que transferem-se através, entre e nos corpos e mentes, e entre o psíquico e o político. Portanto, vale notar que enquanto a afirmação de Foucault de que “onde há poder, há resistência”[23], não estava endereçada diretamente às noções psicanalíticas, esta também não as exclui. Pois sua análise do caráter relacional do poder pressupõe que a resistência tome formas múltiplas:
Estes pontos de resistência estão presentes em todos os lugares na rede de poder. Portanto, não há um locus único de grande Recusa, nenhuma alma de revolta, fonte de todas as rebeliões ou lei pura do revolucionário. Em vez disso, há uma pluralidade de resistências[…] termos estranhos nas relações de poder[…] distribuídos de forma irregular[…] o enxame de pontos de resistência atravessam as estratificações sociais e as unidades individuais[24].
Fanon, claro, bebia extensivamente, e também criticamente, de Freud (e também de Adler, Erikson, Jung e Lacan) mesmo que ele fosse mais influenciado pela fenomenologia[25]. Ele também foi claramente influenciado psicanaliticamente na ênfase que colocou no papel da experiência infantil, como quando cita o tropo de Nietzsche, “a tragédia do homem é que ele uma vez foi uma criança” tanto no começo quanto no fim de “Pele negra, máscara branca”[26] (a partir de agora “PNMB”). O que Fanon considera uma experiência colonial é uma explicação psicoafetiva[27] que oferece recursos para a compreensão da dinâmica da colonização interna[28] e seus efeitos perversos ou conflituosos[29]. Então, a despeito das vastas críticas de Fanon à psicanálise e à psiquiatria colonial (como ao recusar a existência do complexo de Édipo nas Antilhas, em PNMB, e de suas acusações relacionadas à maneira pela qual a psiquiatria colonial trata o nativo como uma criança atrasada em CDT), ele se inspira na psicanálise para elaborar ambas sua teoria e método. Significativamente, para Fanon, isso emerge via a questão da linguagem e poder. Em PNMB[30] temos que:
[…] todos estes questionamentos levam somente a uma direção: fazer um homem admitir que ele é nada, absolutamente nada – e que ele deve por um fim ao narcisismo no qual ele se fia para imaginar que ele é diferente de outros “animais”. Isso se resume a nada mais nada menos que uma rendição do homem[31].Então o método, para se contrapor a este desastroso “narcisismo no qual ele se fia para imaginar que ele é diferente de outros “animais”[32], é analisar o que ele chama de “falhas”:
Tendo refletido sobre isso, eu pego meu narcisismo com ambas as mãos e eu viro minhas costas à degradação daqueles que fariam do homem um mero mecanismo[…]. Eu estou disposto a trabalhar no nível psicanalítico – em outras palavras, o nível das “falhas”, no sentido que se fala de falhas mecânicas[33].
Ou seja, o “mecanismo” pode “falhar”, mas esta falha, ou melhor sua admissão, o falar de sua falha, é o lugar a se começar. Eu retornarei ao papel da falha ao propor que isso oferece uma leitura diferente da prática revolucionária psicopolítica, educacional de Fanon.
(Disrupções de) método e linearidade.
Isso nos leva a um segundo ponto metodológico endereçado por estes três (conectados, mas mutuamente friccionados) quadros de compreensão. Todos os três se concentram em uma perturbação de método, que é útil para a psicologia e educação críticas. A teoria feminista não somente afirma a conexão chave entre ontologia (ser) e epistemologia (conhecimento) como central para desafiar objetivismos espúrios masculininistas, mas também como isso significa que a teoria e o método estão intrinsecamente ligados[34]. Fanon também oferece alguns comentários metodológicos nas primeiras páginas de seu primeiro livro. Ele antecipa discussões de “metodolatria” em psicologia qualitativa como diversivas, em sua mímica da preocupação com métodos da pesquisa quantitativa[35]. Com o escárnio característico, ele escreve:
É de bom tom introduzir um trabalho em psicologia com uma afirmação de seu ponto de vista metodológico, eu serei negligente. Eu deixo métodos para os botânicos e matemáticos. Há um ponto no qual métodos devoram a si próprios[36].
Não obstante a complexidade de suas ideias, Foucault foi explícito e sistemático na elaboração de seus métodos ou abordagem analítica em diversos de seus artigos chave[37], assim como na História da Sexualidade. Ainda assim, o que sua “caixa de ferramentas” trabalhou para importar a hermenêutica da suspeita: daí sua noção da história do presente para descrever o contar da história como uma prática de legitimação das condições atuais, em vez de simplesmente um relato do passado[38].
Isso traz questões de temporalidade à tona. Como um projeto de transformação sociopolítica, feminismos de todos os tipos estão engajados em práticas tanto de crítica quanto de prefiguração: ou, o que tem sido chamado de o tempo futuro perfeito[39]. Como Jardine escreve, essa é “uma modalidade que não implica nem que nós estamos desamparados ante algum destino inevitável nem que nós podemos de alguma maneira, dado tempo e pensamento suficientes, construir um futuro perfeito”[40]. Por contraste, Foucault é frequentemente citado como afirmando que “imaginar outro sistema é estender nossa participação no sistema presente”[41], expressando sua suspeita de utopias/alternativas, como estando fixas em relação às – mesmo se precisamente porque tenta transcender ou acabar com – condições presentes[42]. Ainda assim, isso também foi anunciado por feministas como alertas úteis de afirmações políticas demasiado ambiciosas[43].
Fanon, como um revolucionário político dentro da luta Argéliana por libertação, foi comprometido explicitamente e ativamente com um projeto de transformação política, assim como tratou do problema causado pela opressão colonial e racializada. Enquanto em seus últimos livros ele, obviamente (dado suas afiliações nacionalistas) se alinha a uma narrativa desenvolvimentista do progresso nacional em direção à mobilização de massa e democracia popular, em PNMB inclui alguns comentários acerca da temporalidade que são surpreendentemente próximos tanto a análises feministas quanto foucaultianas. Claro que a ambição já está lá: “Idealmente o presente sempre contribuirá para a construção do futuro”[44], mas – como que com a cautela foucaultiana – esse futuro é construído através de escutar as condições atuais: “De maneira alguma eu me comprometeria com a preparação de um mundo que virá depois. Eu pertenço irredutivelmente ao meu tempo”[45]. De fato a perspectiva de Fanon em relação à luta e comprometimento por transformação não é meramente fazer um novo mundo para outros. Em vez disso:
É para o meu próprio tempo que eu devo viver. O futuro deve ser um edifício sustentado por homens viventes. Essa estrutura está conectada com o presente na medida em que eu considero o presente em termos de algo a ser excedido[46].
Tensões.
Até agora eu estive circundado entre esses três recursos críticos (feminismos, Foucault e Fanon). Antes de me mover para concentrar-me exclusivamente em Fanon, as tensões mútuas entre esses quadros críticos devem ser ressaltadas. Há uma crítica feminista séria à Foucault, que vai além daquela fácil, em que ele não considerou realmente subjetividades de mulheres ou feminizada[47]. Esse engajamento tem sido, sem dúvida, tão frutífero quanto tem sido crítico[48]. Há também uma crítica feminista incisiva à Fanon, que primeiramente, enfatiza a misoginia incipiente, o androcentrismo e a homofobia de suas discussões (em PNMB), assim como em algumas recepções de seus escritos[49]; em segundo lugar, interpreta estas como versões deslocadas de suas próprias ansiedades biográficas como um homem Antilhano[50]; em terceiro lugar, interroga seu investimento nacionalista romântico na mulher Argéliana[51]; e, em quarto lugar, nota como ele oferece pouco no sentido de uma crítica da família, mesmo que tenha criticado algumas práticas patriarcais dentro da família camponesa, especialmente no que se refere ao trabalho de mulheres na Argélia rural.
Enquanto o extenso engajamento feminista com perspectivas foucaultianas já tenha sido indicado, deve-se também ser notado que o trabalho de Fanon informa e sustenta desafios para os feminismos (especialmente de segunda onda Euro-norte-americanas) em termos de levar o colonialismo a sério[52]; enquanto algumas discussões recentes tem sugerido que Fanon pode prover uma explicação melhor, no sentido de mais especificamente situada, da subjetificação[53]. Claramente, Foucault oferece um contraponto à narrativa histórica progressivista de Fanon, entretanto, como irei argumentar abaixo, em suas explanações de sua prática clínica, Fanon está muito mais próximo da abordagem freudiana e foucaultiana da temporalidade.
Em termos de relevância para a educação e psicologia, Fanon é assertivo:
A análise que eu estou empreendendo é psicológica. Apesar disso é aparente a mim que a desalienação efetiva do homem negro implicava o imediato reconhecimento das realidades social e econômica[…]. Será visto que a alienação do homem negro não é uma questão individual. Para além da filogênese e da ontogênese há a sociogênese[54].
Sem ignorar a especificidade desta análise racializada particular (e a propósito, de gênero), também é possível tratar a descrição do “homem negro” de Fanon como também apoiando um sujeito alienado mais generalizado e, portanto, relevante para contextos políticos mais gerais e atuais. Sua afirmação de que provê “um sociodiagnóstico” oferece resistência a (ab)usos individualizantes e patologizantes da psicologia e da educação, embora também ressalte as consequências psicológicas de relações sociais de opressão e exploração, e – como praticante da saúde mental, assim como um porta-voz político – torne prático seu apoio às forças revolucionárias.
A prática psiquiátrica de Fanon.
Tendo praticado a psiquiatria na França, em Lyon[55], uma vez designado para a Argélia, Fanon trabalhou como diretor clínico de Blida-Joinville, um hospital de saúde mental fora de Argel. Lá ele aplicou a abordagem da “psicoterapia institucional” que ele tinha aprendido de François Tosquelles em seu estágio em Saint Alban, reformando radicalmente o cuidado com os transtornados[56]. Tosquelles havia se envolvido tanto profissionalmente como politicamente na luta antifascista na Espanha[57]. Murard[58] traça as origens dessa abordagem desde desenvolvimentos na Grã-Bretanha acerca de soldados traumatizados pela guerra. Desenvolvimentos no Reino Unido[59] levaram formas bem diversas para as origens da psicoterapia grupal nos sermões ou palestras morais de Trigrant Burrow para os transtornados ou alienados nos Estados Unidos[60]. Deste modo, foi via Tosquelles que Fanon encontrou o que pode ser compreendido como um tipo de prática psicoeducacional bem diferente – informada psicopoliticamente, que Gibson[61] liga ao seu modelo de organização revolucionária. Além disso, Fanon abrigava dissidentes políticos e forneceu ajuda psicológica para as casualidades de guerra. Essas casualidades incluíam tanto torturados quanto torturadores, até que Fanon sentiu-se muito comprometido eticamente e demitiu-se em 1957, partindo da Argélia, para Tunes onde ele continuou a trabalhar como psiquiatra e porta-voz político da Frente de Liberação Nacional (FLN)[62].
Como é bem conhecido, a questão da identidade tem grande lastro no trabalho de Fanon, como uma característica de afirmar a subjetividade para aqueles que foram privados dela através da desumanização e subjulgo. Fanon abre a seção de “Colonial wars and mental disorders,” que compreende as últimas 50 páginas de seu livro final, Os Condenados da Terra[63], com a afirmação “o colonialismo força as pessoas que domina a perguntar a si mesmas constantemente a questão: ‘Na realidade, quem sou eu?’”[64]. Mas aqui está claro que isso é também uma questão acerca da reivindicação do mundo, da realidade, da demanda por uma realidade diferente; um vislumbre de que essa, atual, realidade não é tudo o que há.
Não obstante à sua prática, por vezes não-convencional (por exemplo, há relatos de que ele às vezes usava drogas e até mesmo terapia eletro-convulsiva[65]), aqui Fanon mais documenta do que diagnostica. Ele apresenta os casos como evidências “eloquentes”[66] de uma “guerra total” contra os argelianos. Então, oferece seu “sociodiagnóstico”[67] como uma crítica não somente dos modos que a psiquiatria colonial serviu o regime de ocupação e legitimou a “pacificação”[68] dos “nativos”, mas também como essa “pacificação”, ela própria produz patologia.
Claramente seu argumento é o de que a “cura” não pode ser encontrada meramente em terapia interpessoal, mesmo quando demonstra o transtorno psíquico da colonização. Fanon escreve de formas particulares de (o que ele chama) “patologia mental”, que surge durante períodos relativamente calmos de colonização (aparentemente bem-sucedida), incluindo o tédio agressivo de inatividade forçada ou supressão, produz com aparência de ennui, um ressentimento fervilhante que por vezes entra em erupção de forma destrutiva e é deslocado em relação àqueles que são próximos ao sujeito, em vez de ser direcionado à fonte da opressão. Mais tarde nessa seção ele escreve:
O argeliano, exposto às tentações de cometer assassinato todos os dias – fome, despejo de seu quarto porque ele não pagou o aluguel ainda, os seios secos da mãe, crianças como esqueletos, a praça do edifício que fechou, os desempregados que se penduram sobre o capataz como corvos – o nativo vem a ver seu bairro como um inimigo impiedoso. Se ele topa com seu pé descalço contra uma pedra grande no meio do caminho, é um nativo que a colocou lá; e as poucas azeitonas que ele ia colher, as crianças do X já foram e as comeram de noite. Pois durante o período colonial na Argélia e em outros lugares, muitas coisas podem ser feitas por alguns pontos de semolina. Diversas pessoas podem ser mortas por ela[69] [70].
Como o colonialismo que se infiltra na psique, nós podemos também considerar formas de subjetividade diminuídas e perturbadas produzidas pela precariedade, pobreza e um senso minuciosamente desmantelado de uma conexão conjunta a uma coletividade social mais ampla que isso produz; ou de fato onde a filiação é oferecida somente em uma base patologizada e desumanizada[71]. Portanto, mais tarde nessa seção de CDT, Fanon escreve: “As pessoas colonizadas acham que elas estão reduzidas a um corpo de indivíduos que somente encontram coesão quando na presença da nação colonizadora”[72].
Histórias de caso de Fanon.
Em CDT, Fanon oferece um relato sistemático dos impactos psíquicos do subjugo colonial. Apesar de afirmar “evitar todos os argumentos sobre semiologia, nosologia e terapêutica”[73], ele comenta sobre a falsa distinção entre explicações intrínsecas e orientadas pela reação:
Parece a nós que nos casos aqui elegidos os eventos dando origem à desordem são primariamente a atmosfera sedenta de sangue e impiedosa, a generalização das práticas inumanas e a impressão firme de que as pessoas têm de serem pegas em um verdadeiro Apocalipse[74].
Ele posteriormente formula sua análise do caráter político e psíquico irredutivelmente combinado como localizado em um contexto específico: ” Essas são psicoses reacionárias, se nós quisermos utilizar uma etiqueta pronta; mas aqui nós devemos dar uma prioridade particular à guerra: uma guerra que no todo e na parte é uma guerra colonial”[75].
Há quatro “séries” de casos revistos em “CDT, e cada “série” se subdivide em “casos”[76] diferentes. Significantemente, esses casos são relatados como encontrados nos hospitais, entre seus pacientes privados, e nos serviços de saúde do Exército de Liberação Nacional (Fanon, 1961/1963, p.204) – para o qual Fanon também provia suporte profissional. Eu oferecerei agora uma leitura de um dos casos de Fanon. Aqui questões de método, de temporalidade, da pedagogia psicoeducacional de sua prática política e professional entram todas em jogo. A consideração destas nos leva a algum detalhamento – de ambos o caso e da narração de Fanon do caso. Atender a ambos requer exposição considerável do caso e portanto, uma alternância entre relato e comentário, incluindo algumas reflexões feministas.
A história do homem: a potência perdida de B-.
O primeiro caso de sua Série A é intitulado “Impotência em um Argeliano, seguido de estupro de sua mulher”[77]. Isso já oferece uma explicação. Ainda os problemas iniciais apresentados pelo homem, a quem é referido como “B-“, eram ansiedade, dores de cabeça, insônia e falta de apetite – sintomatologia depressiva generalizada prontamente reconhecível em grupos oprimidos. Fanon ainda se esforça para enfatizar que historias pessoais específicas assim como eventos políticos estão em jogo. Esse homem argeliano, um motorista de taxi aposentado, cujos serviços à FLN eram originalmente de sua capacidade, foi pego em uma disputa entre a FLN e as forças francesas e forçado a se esconder. Ele passou os três anos seguintes na Maquis (resistência armada), longe de sua família, tempo durante o qual sua esposa foi levada pelas forças francesas, onde ela foi espancada e estuprada.
Na admissão à Blida, Fanon relata que:
[…] a superfície […] tela de otimismo derretido, e o que nós vimos em nossa frente era um homem pensativo, depressivo, sofrendo de perda de apetite que ficava em sua cama. Ele evitava discussão política e apresentava uma falta de interesse acentuada em tudo relacionado à luta nacional[78].O desenredar dessa história envolve um conjunto de associações ligando sua impotência sexual (em relação a uma mulher que não era sua esposa) a um sonho “no qual o paciente viu o apodrecimento rápido de um gatinho acompanhado por odores insuportavelmente maus”[79]. Além disso, juntamente aos seus relatos de seus esforços para superar sua impotência estava que “alguns segundos antes do ato, ele teve um impulso irresistível de rasgar a foto de sua garotinha”[80], afirmando que havia “algo podre nela”[81]. Recontando isso para Fanon, ele “falou a nós pela primeira vez de sua mulher, rindo e dizendo a nós: ‘ela experimentou os franceses’”[82]. Vale notar que Fanon e seus colegas (aqui referidos como em diversas vezes como “o Serviço”) relatam considerar inicialmente a possibilidade de que o “impulso irresistível”[83] de rasgar a foto poderia indicar desejos incestuosos (ou ainda, implicitamente, esforços para os repudiar). É somente o sonho e entrevistas seguintes que “nos levam a tomar um outro curso”[84].
Então aqui nós temos uma conexão feita entre o pessoal e o político expresso através de relações sexuais e de gênero, incluindo a violência sexual, mas também a guerra. Pois este homem vem ao hospital, referido como “encaminhado pelo Serviço de Saúde da FLN”[85], porque ele está muito mal para cumprir uma missão político/militar na resistência:
Eu me casei com essa garota apesar de amar minha prima… Eu não era muito ligado a minha esposa. E com os problemas, eu fui me separando cada vez mais. No fim eu costumava vir e comer minhas refeições e dormir quase sem falar com ela[86]
Eles não eram próximos, mas Fanon cita B- reconhecia que o estupro de sua esposa pelas forças francesas foi um resultado direto dela o proteger e proteger Maquis, ao se recusar a traí-los. Então mesmo antes de ele poder voltar para casa, já havia resolvido se reunir à ela:
Aquilo não foi um simples estupro, por querer algo melhor para fazer, ou por razões sádicas como aquelas que eu tive a ocasião de ver nas vilas; foi o estupro de uma mulher obstinada, que estava pronta para suportar tudo para não entregar seu marido. E o marido em questão, era eu. Foi por minha causa que ela havia sido desonrada. E ainda assim ela não disse a mim: “Olhe tudo o que eu tive que suportar por você.” Pelo contrário, ela disse: “Esqueça-me; comece sua vida de novo, pois eu fui desonrada.” Foi a partir daquele momento que eu tomei minha própria decisão de retomar novamente minha esposa depois da guerra[87].
No entanto, embora ainda longe, “frequentemente, enquanto eu estava olhando a foto de minha filha, eu costumava pensar que ela também estava desonrada, como se tudo que tivesse a ver com minha esposa estar podre”[88].
O que Fanon parece estar implicando, em sua narrativa deste “caso”, é que o transtorno precisa ser situado não somente dentro do contexto sociopolítico, mas também que isso tem pré-condições. Escutando a psicobiografia do próprio B-, seu problema não foi somente “causado” por sua reação ao estupro como uma estratégia colonial-patriarcal deliberada e brutal de “desonra”/transtorno, mas também (está implícito, apesar de não dito) como uma resposta a crescente consciência de sua falta de cuidado prévia com ela. Essa falta de cuidado foi induzida por conflitos anteriores sobre casar-se com a pessoa “errada”, juntamente com sua luta para superar seu senso de revulsão pelo seu espaço marital/posse do corpo dela tendo sido invadido e ocupado.
Gênero, tecnologia, e representação: leituras Feministas/foucaultianas.
Podemos pausar para comentar aqui, inspirados tanto em Foucault quanto nas análises feministas/queer. Primeiramente, já a significância da foto da filha “substituindo” a mãe. Isso surge via uma cadeia de associações entre sexualidade e gênero, assim como as conexões de longa duração entre estupro e guerra, uma conexão possibilitada pela interconexão entre gênero e infância, com a menina-garota feita “podre” como uma (alinhada ao gênero) substituta para/equivalente possível da orientação afetiva para a mãe. Porém é também uma expressão de uma prole equivalente possível como o resultado do estupro da mãe, mesmo se também pudesse ser uma (talvez acurada) antecipação do estigma que ela pode encontrar por causa do que aconteceu a sua mãe, já que o transtorno de B-, concentra-se em ver sua filha agora desonrada através da associação com a “podridão” de sua mãe.
Assim, a (menina)criança está conectada com a criação violenta de uma futuridade (distópica) nacional, assim como e necessariamente via – ou seja, também pressupondo seu status representativo – um sinal material da heteronormatividade reprodutiva[89]. (A possibilidade destas conexões é ainda mais marcante pela especificação desta “garotinha” como tendo a idade de “um ano e oito meses”[90]; no momento em que B- vai para o exílio forçado). Além disso, é a significância de ser uma representação da filha, uma foto, ao redor da qual todo seu trabalho psíquico ocorra. Isso traz quatro pontos à cena.
Primeiramente, conduz o trabalho de substituição e associação (metáfora e metonímia) facilitada ao redor do gênero e da geração através de discursos heteropatriarcais da família, nos quais mulheres e crianças partilham um status comum como objetos da posse “natural”; um discurso em virtude do qual – não nos esqueçamos – a dominação colonial foi, por extensão analógica, legitimada[91].
Também, em segundo lugar, através dessa associação, temos de Fanon um exemplo material de como a tecnologia moderna entra na vida psíquica, precisamente através de complicações de temporalidade e identificações colocadas em marcha[92]. A fotografia, como o inventor da câmera Oliver Rendell Jones coloca, é “um espelho com uma memória”[93]. O nascimento e portanto existência da “menininha” de B-[94], sua “filhinha”[95], data de antes de sua fuga para o esconderijo e portanto não é, de fato, o resultado de um estupro pelos franceses. Mesmo assim, ecoando a discussão de Barthes[96] sobre a fotografia como punctum, “a laceração do espectador por um detalhe” (como citado em Scott[97]), ela parece estar associada com funções e portanto como um lembrete disso, após o evento; junto com talvez como ela pode agora estar desonrada através de sua relação com sua mãe. Isso parece alimentar o desejo de rasgar a foto – como se por tal pensamento mágico, ele pudesse apagar o evento traumático. Como Barthes coloca: “O trauma é uma suspensão da linguagem, um bloqueio do sentido. Certas situações que são normalmente traumáticas podem ser apreendidas em um processo de significação, mas então precisamente elas são indicadas por um código retórico que os distancia, sublima e pacifica” (como citado em Scott[98]).
Em terceiro lugar, é também a foto que facilita a transição psíquica da mãe para a filha. Nós ainda não ouvimos nada sobre se a “menininha” lembra sua mãe (nem sabemos qual sua idade na fotografia, já que ele esteve separada dela desde que ela era um bebê, de acordo com as datas fornecidas por Fanon e o intervalo notado, ela tem agora pelo menos 4 anos e 8 meses)[99].
Mas, em quarto lugar, a sequência de narração relatada sobre à topografia do transtorno é importante. B- diz: “Então eu decidi levá-la (sua esposa) de volta; mas eu não sabia como eu me comportaria ao vê-la. E, frequentemente, quando eu olhava para a fotografia de minha filha, eu costumava pensar que ela também tinha sido desonrada, como se tudo relacionado a minha esposa estivesse podre[100]. Para se concentrar em cada passo: há a decisão de “levar de volta” sua esposa. Há sua ansiedade de gerenciar sua própria resposta de “como eu me comportaria quando eu a visse”. Ambas decisão e incerteza/ansiedade tornam-se o foco ao olhar a foto, tudo alimenta o sensação da “desonra” migrando da mãe para a filha.
Mediações, representações e mudanças de temporalidade.
Há ainda outro nível de representação acontecendo. Logo que o relato da história do caso de Fanon se desenrola do presente para o passado e retorna novamente, esse cenário de reconciliação ambivalente se dá na fantasia, pois B- não retornou ainda de fato para sua esposa. Ele soube do estupro indiretamente, enquanto estava no esconderijo. O texto deixa claro que, por conselho de sua mãe, a esposa de B- enviou uma mensagem a seu marido enquanto ele estava desaparecido “na qual ela pedia que ele a esquecesse, pois ela havia sido desonrada e ele não deveria pensar em retomar a vida deles em conjunto novamente”[101]. Apesar de B- ter recusada por seu comandante uma permissão para retornar para casa com intuito de vê-la, em vez disso um membro da FLN foi enviado para ver a esposa de B- e seus pais e então “um relatório detalhado chegou até o comandante da unidade de B-“[102]. Foi a partir desse “relatório detalhado” que B- soube o que havia acontecido. Portanto o que está sendo expressado aqui é a sua resposta, e antecipações de sua resposta, quando eventualmente ele poderia retornar à casa.
Três outros pontos para consideração emergem: o primeiro é que ele sabe dos detalhes do estupro através do relatório do operativo da FLN para o seu comandante, que é então passado a ele. Talvez, como é bem sabido da prática legal[103], o caráter público dessa cadeia de relatórios tenha um impacto (re)traumatizante. O segundo é que é digno de nota que estas dificuldades psicológicas emergiram somente uns dois ou três anos após esse relatório, quando B- foi chamado para outra missão, assim como tentava outras emissões (um relacionamento com outra mulher). O terceiro ponto é que isso parece refletir o modelo de temporalidade que informa a análise do trauma de Fanon, de nachträglichkeit, através da qual o segundo evento (de ser chamado para outra missão) re-evocou o primeiro – apesar de qual é o evento traumático primeiro permanece crucialmente indeterminado, ou talvez, sobredeterminado por outras condições políticas.
Sem dizer tão explicitamente, Fanon sugere que é um conflito psíquico (que – culpa, raiva, vergonha – ele não especifica) que causa sua apresentação do problema da impotência. Esse homem não havia valorizado particularmente essa mulher como sua esposa; antes, ele havia até mesmo planejado se divorciar dela. A fidelidade dela a ele é agora apresentada como um bloco, ou talvez – ecoando sua designação de que ela é “uma mulher obstinada”[104] – um obstáculo até – mesmo (ou exatamente) quando ele também tenta ser infiel a ela. Ele não consegue evitar direcionar alguma raiva a ela. Não obstante sua resposta inicial ao ouvir do estupro (“então eu disse, ‘bem, não há muito mal feito, ela não foi morta’”[105]), o discurso do estupro como uma desonra voluntária instalada pelos franceses – “se você vir seu marido imundo alguma vez de novo não se esqueça de contar a ele o que fizemos com você”[106] – é o que fica: “mas aquela coisa – como eu posso esquecer uma coisa como aquela? e por que ela tinha que me contar tudo?”[107].
A mulher como um sujeito falante?
A esposa de B- aparece somente indiretamente nesse caso, esperadamente talvez como uma voz subalterna[108]. Ainda assim sua presença é poderosa, não somente como uma leal sobrevivente de estupro político e de tortura; não somente como uma mulher que se auto sacrifica e que é uma esposa cúmplice da cultura que – tendo salvado a sua vida e a de seus companheiros políticos – convidou seu marido a lhe deixar por conta da desonra da violência sexual. Ela é (descrita por seu marido como) uma “mulher obstinada”, uma descrição um tanto derrogatória para alguém cuja “desonra” foi um resultado direto de proteger (ao se recusar revelar o paradeiro de) seu marido e a organização.
Mas ela também é um sujeito falante, e é o seu discurso que parece traumatogênico. Primeiro, ela envia uma mensagem a seu marido, liberando-o de seu casamento por causa de sua “desonra”; em segundo lugar, ela dá a informação de seu aprisionamento, tortura e estupro para o “relatório detalhado” que é levado de volta para o comandante, e então revelado a B-. Tudo isso precipita as deliberações de B- sobre voltar para ela, e como ele se sente a respeito disso, se ele será capaz de corresponder a sua resolução e compromisso político a retomar suas responsabilidades e intimidades com ela.
Um silêncio revelador, que fala significativamente nesse texto, é sobre o desejo dela em relação a estar “de volta” com ele. Isso deveria ser levado em consideração junto com a reclamação de B- sobre o que não deve ser esquecido (sua negligência dela no passado?) e o que ele preferiria que não tivessem contado a ele (“como você pode esquecer uma coisa como aquela? E por que ela tinha que me contar sobre tudo isso [ênfase nossa]?”[109]. No entanto, não foi de maneira alguma por ela que “tudo” foi “contado” a ele, mas por muitos relatores intermediários. Isso convida outras questões, inclusive o que mais ele não quer ouvir, e talvez especialmente a questão do próprio desejo dela. Pois (nas palavras de Fanon), o “momento” que permite “a recontrução de toda sua história”[110], não é somente o relato de rasgar a foto, ou do sonho, mas de quando B- fala com sua esposa pela primeira vez, que é ao dizer que “Ela experimentou os franceses”[111].
Um estupro foi transposto para uma afirmação oral e sexual ativa. O que nós devemos fazer disso para não condenar o descrito com a clássica culpabilização da vítima?[112] Esse estupro, metonimicamente ligado à questão da própria potência sexual de B-, coloca questões sobre não somente a função de sua esposa como um condutor indireto que o machuca e aterroriza militantes argelianos, mas sobre os próprios desejos dela (e por extensão, de outras mulheres)?
O quebra-cabeças pedagógico do quê é “o problema”.
O “problema de [sua] esposa”, no entanto, não é somente se B- está disposto a aceitá-la de novo, mesmo que ele reconheça que está “abalado” ao ver outros homens confortando e abraçando suas esposas estupradas. Nem mesmo sua incerteza acerca de poder superar sua resposta (não-nomeada), ou possível resposta a “violação” dela (de nojo, talvez, como está sugerido pela “podridão” de seu sonho). O problema também parece surgir de seu reconhecimento tardio sobre sua negligência para com ela; de fato, de não meramente a ter considerado, mas também de não tê-la levado a sério.
Mesmo assim Fanon é explicitamente pedagógico em seus escritos, para “ajudar” a construir o processo de conscientização:[113]
O problema teórico importante é que é necessário sempre e em todos os lugares tornar explícito, desmistificar, e atormentar o insulto à humanidade que existe em alguém. Não deve haver espera até que a nação tenha produzido um novo homem; não deve haver espera até que os homens estejam imperceptivelmente transformados por processos revolucionários em renovação perpétua. É bem verdade que esses dois processos são essenciais, mas a consciência deve ser ajudada[114].
Portanto ele narra uma forte lição política como aprendida por B-, que relata ver outros homens “secando as lágrimas de suas esposas após terem as visto estupradas sob seus olhos”[115]. Em uma segunda, até mesmo mais clara, referência à criança como questão/resultado do estupro – com a juventude de gênero feminino agora vinculada a vítima do estupro – Fanon nota o reconhecimento de B- a partir de seu assombro ao ver homens “propondo casamento à garota que foi violada pelos soldados franceses e que estava gravida deles”. Essas experiências fazem B- “reconsiderar o problema da [sua] esposa”[116].
Então uma nova possibilidade interpretativa emerge. O que mais a menininha poderia representar? Ou, melhor, o esforço para desfazer ou destruir o presente, evidência material dela? Poderia ser a intolerância de agora considerar a existência de sua filha, através de sua “reconsideração do problema da [sua] esposa” como resultado da falta de sua atenção sexual para com sua esposa? Ou seja, da filha como tendo vindo à existência através de um tipo de estupro? Isso identificaria então B-, retroativamente, com os estupradores de sua esposa (em um modo diferente, mas tão danoso quanto, àquele que eles haviam pretendido); ou seja, com os colonizadores que ele combate. E para que tenhamos a analogia, mesmo a metáfora ou identificação paralela, entre a dominação francesa dos (feminilizados enquanto colonizados) homens argelianos com a dominação masculina (argeliana) das mulheres.
O fim da terapia: (ir)resolução e/como revolução.
Eu tenho derivado essa leitura das quatro páginas e meia que compreendem esse “caso” como apresentado por Fanon; o primeiro em seu catálogo de miséria, angústia, e às vezes assassinato que abrangem a seção sobre “Guerra Colonial e Desordens Mentais”, na qual Fanon adota o discurso médico da história e trauma do caso psiquiátrico para transmitir o dano produzido pela opressão e violência colonial. Duas outras características justificam a atenção antes de deixarmos esse caso. Primeiro, Fanon mantém-se próximo ao relato e observações das respostas e condições do próprio homem. As atribuições emocionais (de conflito, vergonha ou culpa) que eu sugeri são minhas próprias, não de Fanon. Seu texto deixa muito sugerido, e não afirmado, como uma estratégia-chave política – e eu sugeri psicoeducacional – de documentar, de evidenciar ou testemunhar, no lugar de diagnosticar ou “tratar”.
Fanon era um psiquiatra e psicoterapeuta. Então, em segundo lugar, essa não é somente uma mobilização tática do discurso psiquiátrico de uma história de caso. De fato, contrário a outros apresentados, o caso de B- é também a história de uma relação de consultas, de busca por ajuda e de recebimento dentro de um conjunto mais largo de relatos. As intervenções e interpretações narradas não são extensivas.[117] Em vez disso, o foco é em como “nós reconstruímos toda a história. A trama de eventos para formar um padrão foi tornado-se explícita”[118]. Dado o projeto pedagógico de tornar públicos os impactos psíquicos da guerra colonial, a representação “explícita” não parece necessariamente tornar tudo isso consciente a B-, mas prover um espaço para sua articulação. Porém, não obstante os poucos traços textuais da abordagem terapêutica, o relato indica uma virada terapêutica. Enquanto a voz do narrador do caso se moveu do relato do psiquiatra de como esse homem estava quando ele chegou para um primeiro relato escrito (em letras menores) na voz do paciente, a voz profissional de Fanon volta a relatar no final da conversa:
Ele então me perguntou se sua “falha sexual” era em minha opinião causada por suas preocupações.
Eu respondi: “Não é impossível”.
Ele então sentou-se reto na cama. “O que você faria se tudo isso tivesse acontecido a você?”
“Eu não sei.”
“Você aceitaria sua esposa de volta?”
“Eu acho que eu iria…”
“Ah, aí está, você vê. Você não está bem certo.”
Ele segurou sua cabeça em suas mãos e após alguns segundos, deixou a sala.[119]
O que fazer disso? A perícia de Fanon como um profissional, afirmando um sintoma (que em sua tipologia médica ele havia classificado como uma “psicose reativa”[120]) é no início convocada (que, como ele enfatizou antes, não é menos devastador ou duradouro em seu novo por seu estatuto “reativo”); então sua posição como um homem, um homem heterossexual, ou como alguém que é convidado a se identificar com um (“O que você faria…?”). Inicialmente, Fanon topicaliza a incerteza, talvez não somente aquela do praticante ético querendo não “conduzir” seu paciente, mas quando pressionado uma segunda vez, ele (igualmente ético, eu devo argumentar) sugere que ele anteciparia “tomar de volta” a esposa.
Ainda assim, B-, o paciente, é retratado como parecendo encontrar algum conforto ou validação na falta de certeza da resposta de Fanon (“Ah, aí está, você vê…”), como se isso legitimasse suas ruminações e fantasias. Parece não ter sido uma diretiva que ele procurava, mas um reconhecimento do dilema. O segurar da cabeça sugere alguma deliberação a mais, e então ele parte. Isso é retratado como o fim, ou a culminação, da terapia. O sintoma foi socializado, interpretado no discurso; tornou-se comunicável e talvez suportável. Então, após Freud transformar a miséria histérica em infelicidade comum, ou oferecer um modelo psicanalítico mais social que topicaliza a linguagem:
A linguagem do sintoma, apesar de já ser uma forma de comunicação, é autista. Ela balbucia para si mesma secretamente, esperando ser ouvida; seu sentido equivalente transmitido em palavras é social. O processo de comunicação é o meio de todas as outras agências terapêuticas… Então já um movimento de sintoma para problema, de sonho para conflito subjacente ao sonho.[121]
Como sempre com Fanon, temos quase uma descrição pictórica de um conjunto de estágios na instalação decisiva de uma estrutura psíquica transformada (que em outro lugar eu ligo à consideração de Lacan da criação do laço social intersubjetivo[122]). De fato, o restante da “história de caso” é o relato de Fanon da recuperação de B-, uma recuperação que – significantemente – concerne re-engajamento político assim como a desaparição gradual de seus sintomas psicóticos/psicossomáticos:
A partir daquele dia, ele estava progressivamente mais disposto a escutar discussões políticas e ao mesmo tempo as dores de cabeça e a falta de apetite diminuíram consideravelmente.
Após duas semanas ele retornou à sua unidade.[123]
Fanon, o psiquiatra revolucionário, havia feito seu trabalho: um combatente da resistência psicologicamente ferido foi capaz de retornar à luta militar. Mas isso não foi somente o remendar de um soldado para que seus problemas psicológicos não mais afetassem seu trabalho e ele pudesse retornar para lutar. A jornada iluminou as conexões íntimas entre o público e o privado, o doméstico e o nacional, os entrelaçamentos complexos entre a dominação heteropatriarcal das mulheres e a identidade nacional, nas quais algumas versões de sexualidade são sancionadas ou exigidas (casamento) e arranjos institucionais (como a família) são correspondentemente organizados. Relações de gênero, de geração e pai-criança estão poderosamente em jogo, não somente na ligação entre filha e mãe na formação da narrativa dos sintomas como também em vários outros papéis que os pais desempenham na história – como arranjadores de casamentos, conselheiros privilegiados em contextos de adversidade, e guardiões da reputação comunitária. A violência – física, sexual, emocional (e Fanon também é sensível à violência econômica também) – é apresentada para ser instigada e como mediando a re-negociação das relações entre o interpessoal e o Estado, mesmo se o aparato proto-Estatal do Maquis oferece um modelo de modernização e mudança. Tudo isso em jogo nos problemas sexuais de um homem, a debilitação de sua potência. E Fanon, como terapeuta ainda mais que um agitador político, é didático, mas não explicitamente diretivo. Seria isso uma instanciação do trabalhar psicanaliticamente no nível da “falha”, da falha dos homens, incluindo nesse caso o que está por trás de uma suposta falha “sexual”?[124]
As frases finais do caso dizem: “antes de partir ele me disse: ‘quando a independência vier, eu tomarei minha esposa de volta. Se não funcionar entre a gente, eu voltarei e o verei em Argel’”[125]. Nessa afirmação resumida, usando as palavras do paciente, autonomia política e pessoal estão ligadas. A liberação do jugo colonial criará as condições não somente para B- como um argeliano atingindo independência nacional, mas isso está conectado com sua liberação de suas compulsões e mentalidade prévias; é a sua “independência” que o autorizará a tentar forjar uma relação nova – menos patriarcal ou colonial? – com sua mulher, que ele está disposto a trabalhar para criar – e para a qual ele planeja recrutar o apoio de Fanon.
Significantemente, essa “independência” é relacionalmente definida mesmo sendo também precisamente incitada relacionalmente, no lugar do modelo tradicional masculinista de autonomia racional destacada. Claro, compromissos militares à parte, adiar o momento de reconciliação marital até a “independência vir” poderia ser considerado como uma desculpa, um protelamento (como na resposta familiar de “depois da revolução” às demandas feministas para esperar pelo socialismo antes de conceder os direitos às mulheres). Ainda assim, a voz narrativa relatada de B- é autoritária. Significantemente, é ele, e não Fanon, quem propõe uma interpretação simbólica e psicossomática de seus sintomas, enquanto a incerteza (ou “falha”?) de Fanon, induz ou provoca o senso de certeza desse homem sobre o futuro, mesmo que se somente nesse ponto seja somente uma certeza imaginada – pois a “independência” nesse ponto está a algum tempo de distância.
A questão que permanece e reverbera de forma intensa com tudo o que sabemos sobre o envolvimento das mulheres em lutas revolucionárias e o que acontece com sua “independência” em seguida, desde as mulheres argelinas na luta pela libertação[126], até as combatentes curdas feministas pela liberdade na Síria atualmente[127], trate-se de quão “independente” será a esposa para decidir aceitar B- de volta ou não. Porém, mesmo que B- (ou Fanon) não aborde tal questão, tampouco a condição psicológica da esposa — uma ausência bastante significativa — é possível entender o trecho “se não funcionar entre nós” como indicativo da existência de um relacionamento, algo “entre nós” para ser negociado, deixando aberta a possibilidade de que o relacionamento não será um simples “retorno” (pois sabemos que não o era antes), mas (utilizando a fraseologia benjaminiana[128]) uma volta ao futuro. Participar das complexas interseções das revoluções em jogo inclui dar um passo para trás para avançar, e assim, Fanon, como psicoterapeuta, frustra os seus críticos foucaultianos, pois já não está tão sujeito ao progressismo modernista, nem ao estatismo.
Para Fanon, isso faz parte de uma narrativa que ele oferece sobre a crescente capacitação e liberação das mulheres através do processo revolucionário, com exemplos da Maquis substituindo a família camponesa para sancionar o casamento, com, naturalmente, a famosa discussão em seu livro anterior, A Dying Colonialism[129], de jovens argelinas realizando ataques militares e bombardeios – quando ganharam confiança e acesso a espaços e viagens dos quais eram excluídas anteriormente. Como White comenta: “Fanon abriu novos caminhos ao sugerir que a violência revolucionária tinha potencial transformador tanto para as mulheres como para os homens”[130]. As representações de Fanon sobre a miséria e a agressão interna produzidas pela subjugação colonial são tipicamente seguidas por exemplos dos efeitos psicossociais e socialmente benéficos da mobilização anticolonial. Há um exemplo fundamental (na seção sobre “Os impulsos criminais encontrados nos norte-africanos que têm sua origem na Guerra de Libertação Nacional”) da maneira como a guerra deslocou o local de agressão e conflito relativo à regulamentação e ao tratamento das mulheres: “Não há explosões de raiva porque a testa da minha esposa ou seu ombro esquerdo foram vistos pelo meu vizinho. O conflito nacional parece ter canalizado toda a raiva e nacionalizado todos os movimentos afetivos ou emocionais”[131].
De fato, “Colonial warsand mental disorders” termina com uma afirmação sobre a interseção entre autonomia psíquica e social, libertação e autodeterminação que especifica o que significa “independência”:
A independência não é uma palavra que pode ser usada como um exorcismo, mas é uma condição essencial para a existência de homens e mulheres que são verdadeiramente livres, em outras palavras, que são verdadeiramente mestres de todos os meios materiais que tornam possível uma transformação radical da sociedade.[132]
A outra mulher.
Após uma leitura feminista de Fanon, com atenção à voz subjugada da mulher no estudo de caso mais extenso de Fanon em CDT, há no entanto, uma voz feminina mais direta nos estudos de caso. Neste caso, a paciente é sujeito da narrativa e não um objeto indireto – como veremos de diversas formas. Trata-se de uma jovem francesa, com 21 anos de idade, que sofria de ansiedade social acompanhada de transpiração excessiva que interferia em seus estudos e na vida cotidiana (“Caso 3. Atitude neurótica de uma jovem francesa cujo pai, um funcionário público do lato escalão, foi morto em uma emboscada”). Mais uma vez, Fanon descarta a superficial “lucidez que tocou na insensibilidade e mais tarde revelou, precisamente pelo seu racionalismo, o desconforto dessa menina e a natureza e origem de seu conflito”[133], e escuta a história, uma história que fornece uma perspectiva complementar – em termos de gênero e geração, bem como em relação ao privilégio colonial – à anterior.
Sua história também é de conflito político-pessoal, travada entre sua resistência (política e emocional) ao luto de um pai recentemente morto, que ela abominava por seu papel ativo nos centros de interrogatório que torturaram as pessoas e o reconhecimento de sua inevitável situação cultural- colonial – racial (como filha de seu pai). O suor que cobre seu corpo é representado implicitamente como equivalente ao dinheiro que lhe foi oferecido após a morte de seu pai, dinheiro que ela não pode suportar como “o preço do sangue derramado por meu pai”[134]. Ela quer trabalhar, mas não pode. De fato, seu conflito não é apenas sobre quem é sua família (ela deixou a casa da sua família para evitar testemunhar os gritos da tortura ocorrendo na casa de seu pai), enquanto as relações de filiação são com a “aldeia argelina” onde ela cresceu: “Eu conhecia quase todas as famílias que moravam lá. Os garotos argelinos da minha idade e eu tínhamos brincado juntos quando éramos pequenos”[135]. Estes eram os rapazes que estavam sendo presos, e em cujas detenções ela reconhece que é percebida como sendo cúmplice: Fanon a cita, “No final, eu não ousei andar mais pela rua. Eu tinha certeza que encontraria ódio em toda parte”[136].
Ao contrário de sua descrição de B-, Fanon não oferece nenhuma resolução ou resultado terapêutico aqui. Ao contrário, como as outras histórias de casos, isso representa um testemunho do sofrimento psíquico intratável gerado pelos conflitos interpessoais (familiares e interculturais) produzidos pela brutalidade colonial e subjugação. Pelo contrário, parece que a mensagem política e pedagógica de Fanon é transmitir os pontos de vista da justiça e da identificação dessa jovem e o chamado à ação: “No meu coração eu sabia que aqueles argelinos tinham razão. Se eu fosse uma argelina, estaria na Maquis”[137].
Então, aqui Fanon, no único lugar onde ele dá voz direta a uma mulher, não só narra uma posição de discurso assertiva e agêntica; ele também oferece uma narrativa pedagógica de solidariedade através da diferença, e contra os limites heteropatriarcais/familiares da presumida aliança “natural”.
Final, mas sem fins.
Eu me concentrei em questões de pedagogia, identificação, temporalidade e subjetividade nesta análise. Para tanto, tentei trazer perspectivas feministas e foucaultianas ao lado, contra e em relação a uma leitura atenta de Fanon, onde ele é mais “clínico” e terapêutico, mas também (emerge) mais político. Aqui, as relações entre intrapsíquico e político, tanto em relação ao conflito quanto à mudança, são tanto o tópico quanto o processo.
E ainda, a partir da própria análise de Fanon e da aparente resolução do caso de B-, parece que tais processos de conflito e mudança são designações instáveis, radicalmente indeterminadas, e assim seu status finalmente se transforma – como enfatizam, em suas diferentes maneiras, as análises foucaultiana, fanoniana e feminista – em uma questão de perspectiva e compromisso. Fanon, com Foucault e a teoria feminista, junto com suas inscrições marxista e freudiana, colocam ênfase nas relações intrinsecamente simultâneas entre o afetivo, o interpessoal e o político; relações que também implicam personificação e movimento. É por isso que precisamos observá-las na prática clínica e educacional, na psicologia teórica e nos ativistas.
Classificar Fanon como psicoeducador, como fiz aqui, destaca seu projeto pedagógico de libertação nacional e também subjetiva. Além disso, essa leitura também corrige a representação dominante dele como programático. Longe de exigir ou pressupor respostas ou resultados específicos, o relato de Fanon sobre sua prática clínica em Os Condenados da Terra mostra sua adesão a uma filosofia muito mais aberta da educação: Uma prática ética que permite a auto autorização através de uma pedagogia da incerteza que insiste em uma abertura radical da contingência como o caminho para a ação autêntica[138].
O que pode ser lido como dito por Fanon, isto é, sua prática psicoeducacional ao dirigir a seus leitores tanto quanto a seus “pacientes”, é não só que os indivíduos não podem ser engajados com como códigos sociais vazios. Em vez disso, o significado dos eventos sociopolíticos e as possibilidades de atividade neles são inevitavelmente moldados por histórias biográficas específicas que são estruturadas, tanto do ponto de vista sócio histórico como idiossincrático. Além disso, tenho sugerido que a prática pedagógica de Fanon em sua narração do caso de B-, o único relato especificamente terapêutico em CDT, não se trata de consertar um soldado para retornar à ação, ou mesmo de aconselhamento sobre reconciliação de um casamento, mas sim da criação de novas capacidades de relacionamento e, assim, de mudança. Crucialmente, isto não defende nem o reducionismo ou instrumentalização social, nem o voluntarismo. Fanon retrata o momento terapêutico e político-pedagógico como intrinsecamente ligado: a sua recusa em responder ao chamado a prescrever, a dizer B- o que fazer, provoca a instalação de uma abertura ou contingência radical, de modo que o sujeito deve agir e decidir por si como agir.
De forma semelhante, essa estratégia (minha própria, pedagógica ou psicoeducacional) de leitura “contra a corrente” entre e contra Foucault, os feminismos e/com Fanon, não é nem moralmente relativista, nem progressista (no sentido de ser teleológica ou desenvolvimentista e, portanto, modernista). Deve muito à teoria da interseccionalidade, no sentido de explorar configurações mútuas e interdependências, assim como os conflitos dentro e entre as estruturas[139]. Não é nem voluntarista, nem alternativamente determinismo estrutural (paradoxalmente, ambas as reivindicações foram feitas da teoria da interseccionalidade, tampouco eu diria que ambas as leituras não podem ser feitas). Tampouco é esta mera repetição (como Butler[140] esclareceu). Em vez disso, sugiro este movimento ou leitura crítica entre níveis de análise e que perpassa planos teóricos e níveis narrativos de pedagogia (de tópico, processo, referente e destinatário) promove entendimentos de subjetividade sensíveis não só a restrições e limites em sua formulação e enquadramento, mas também às possibilidades dinâmicas postas em jogo pela complexidade de suas relações mútuas e instabilidades tão dinâmicas. ♦
Referências
BALSAN, Humbert. (Producer), & SULEIMAN, Elia. (Producer & Director). (2002). Divine intervention [Motion picture]. Produção de Humbert Balsan, direção de Elia Suleiman. USA: Avatar Films, 2002, 1h40.
BARTHES, Roland. (1981). Camera lucida: Reflections on photography. New York, NY: Macmillan.
BELL, Vikki. (1993). Interrogating incest: Feminism, Foucault, and the law. London, UK: Taylor & Francis.
BENJAMIN, Walter. (1969). Illuminations: Essays and reflections. New York, NY: Schocken.
BERGNER, Gwen. (1995). Who is that masked woman? Or, the role of gender in Fanon’s Black Skin, White Masks. PMLA, New York, MLA. 110(1), 75–88.
BURMAN, Erica. (2008). Resisting the deradicalization of psychosocial analyses. Psychoanalysis, Culture & Society, Londres: Palgrave Macmillan UK. 13(4), 374–378.
_____. (2015). Fanon’s Lacan and the traumatogenic child: Psychoanalytic reflections on the dynamics of colonialism and racism. Theory, Culture & Society. Londres: SAGE Publications. Advance online publication: <doi:10.1177/0263276415598627>.
BUTLER, Judith. (1997). The psychic life of power: Theories in subjection. New York, NY: Stanford University Press.
CHAMBERLAIN, Kerry. (2000). Methodolatry and qualitative health research. Journal of Health Psychology. Londres: SAGE Publications. 5(3), 285–296.
CHASE, Elaine & WALKER, Robert. (2013). The co-construction of shame in the context of poverty: Beyond a threat to the social bond. Sociology, Belmont: SAGE Publications. 47(4), 739–754.
CHOW, Rey. (1999). The politics of admission: Female sexual agency, miscegenation and the formation of community in Frantz Fanon. In A. Alessandrini (Ed.), Frantz Fanon: Critical perspec- tives (pp. 35–58). London, UK: Routledge.
COCKBURN, Cynthia. (2013). War and security, women and gender: An overview of the issues. Gender & Development, Londres: Oxfam & Taylor & Francis 21(3), 433–452.
CROWE, Kate. (2015). Sexual assault and testimony: Articulation of/as violence. Law, Culture and the Humanities. Amherst, MA: SAGE Publications. Advance online publication. doi:1743872115577917
DANTO, Elizabeth Ann. (2005). Freud’s free clinics. New York, NY: Columbia University Press.
DE VOS, Jan. (2013). Psychologization and the subject of late modernity. Abingdon, UK: Palgrave Macmillan.
DESAI, Miraj U. (2014). Psychology, the psychological, and critical praxis: A phenomenologist reads Frantz Fanon. Theory & Psychology, Calgary, AB: SAGE Publications. 24, 58–75. doi:10.1177/0959354313511869
DIAMOND, Irene., & Quinby, Lee. (1988). Foucault and feminism: Reflections on resistance. Boston, MA: Northeastern University Press.
EDELMAN, Lee. (2004). No future. Durham, NC: Duke University Press.
FANON, Frantz. (1963). The wretched of the earth (C. Farrington, Trans.). London, UK: Penguin. (Original work published 1961)
_____. (1965). A dying colonialism (H. Chevalier, Trans.). New York, NY: Grove Press. (Original work published 1959)
_____. (1970). Black skin, white masks (C. L. Markmann, Trans.). London, UK: Paladin. (Original work published 1952).
FERGUSON, Kathy. E. (1991). Interpretation and genealogy in feminism. Signs. Chicago: The University of Chicago Press Books. 16(2), 322–229.
FOUCAULT, Michel. (1977). Language, counter-memory, practice: Selected essays and interviews (D. Bouchard, Ed.). Ithaca, NY: Cornell University Press.
_____. (1980). Prison talk. In C. Gordon (Ed.), Power/knowledge: Selected interviews and other writings: 1972–1977 (pp. 37–54). Brighton, UK: Harvester.
_____. (1981). History of sexuality: Vol 1. An introduction. Harmondsworth, UK: Pelican.
_____. (1983). The subject and power: Afterword. In H. Dreyfus & P. Rabinow (Eds.), Michel Foucault: Beyond structuralism and hermeneutics (pp. 208–264). Chicago, IL: University of Chicago Press.
_____. (1988). Technologies of the self. In L. Martin, H. Gutman, & P. Hutton (Eds.), Technologies of the self: A seminar with Michel Foucault (pp. 16–49). London, UK: Tavistock.
_____. (2011). The order of discourse. In Ian Parker (Ed.), Critical psychology: Critical concepts in psychology: Vol. 4. Dominant models of psychology and their limits (pp. 190–220). London, UK: Routledge. (Original work published 1970)
FOUKELS, Siegmund Heinrich & ANTHONY, Elwyn James. (1957). Group psychotherapy: The psychoanalytic approach. Harmondsworth, UK: Pelican.
FRASER, Nancy. (1989). Unruly practices: Power, discourse, and gender in contemporary social theory. Minneapolis: University of Minnesota Press.
_____ (2003). From discipline to flexibilization? Rereading Foucault in the shadow of globali- zation. Constellations. New York: Wiley-Blackwell. 10(2), 160–171.
FREIRE, Paulo. (1972). Pedagogy of the oppressed (M. Bergman Ramos, Trans.). New York, NY: Herder and Herder.
FROSH, Stephen. (2003). Psychosocial studies and psychology: Is a critical approach emerging? Human Relations, Londres: SAGE Pub. 56(12), 1545–1567.
FROSH, Stephen & BARAITSER, Lisa. (2008). Psychoanalysis and psychosocial studies. Psychoanalysis, Culture & Society, Londres: Palgrave Macmillan. 13(4), 346–365.
GATES, Henry Louis. (1991). Critical Fanonism. Critical Inquiry, Chicago: The University of Chicago Press. 17(3), 457–470.
GAZTAMBIDE-FERNÁNDEZ, Ruben. (2010). Interruption and imagination in curriculum and pedagogy, or how to get caught inside a strange loop. Curriculum Inquiry, 40(3) Londres: Taylor&Francis Online. 409–417.
GIBSON, Nigel C. (2013). A wholly other time? Fanon, the revolutionary, and the question of organiza- tion. South Atlantic Quarterly, Durham: Duke University Press. 112. (1), 39–55.
GIORDANO, Cristiana. (2011). Translating Fanon in the Italian context: Re-thinking the ethics of treatment in psychiatry. Transcultural Psychiatry, Montreal: SAGE Publications. 48(3), 228–256. doi:10.1177/1363461511403029
HADDOUR, Azzedine . (2010). Torture unveiled: Rereading Fanon and Bourdieu in the context of May 1958. Theory, Culture & Society, Londres: SAGE Publications, 27(7–8), 66–90. doi:10.1177/0263276410383710
HARAWAY, Donna. (1988). Situated knowledges: The science question in feminism and the privilege of partial perspective. Feminist Studies, College Park: Feminist Studies Inc.14(3), 575–599.
HARDING, Sandra G. (1987). Feminism and methodology: Social science issues. Bloomington: Indiana University Press.
_____. (Ed.). (2004). The feminist standpoint theory reader: Intellectual and political controversies. London, UK: Psychology Press.
HARRISON, Tom. (2000). Bion, Rickman, Foulkes, and the Northfield experiments: Advancing on a different front. London, UK: Jessica Kingsley.
HARTSOCK, Nancy. (1990). Foucault on power: A theory for women? In L. Nicholson (Ed.), Feminism/postmodernism (pp. 157–175). New York, NY: Routledge.
HEKMAN, Susan J. (Ed.). (1996). Feminist interpretations of Michel Foucault. University Park: Pennsylvania State University Press.
_____. (1997). Truth and method: Feminist standpoint theory revisited. Signs, Chicago: The University of Chicago Press Books. 22(2), 341–365.
_____. (2010). The material of knowledge: Feminist disclosures. Bloomington: Indiana University Press.
HOLMSTROM, Lynda Lytle & BURGESS, Ann Wolbert. (1979). Rape: The husband’s and boyfriend’s initial reac- tions. Family Coordinator, Minneapolis: National Council on family relations, 28(2), 321–330.
HOOK, Derek. (2005). A critical psychology of the postcolonial. Theory & Psychology, Calgary, AB: SAGE Publications. 15, 475–503. doi:10.1177/0959354305054748
_____. (2012). A critical psychology of the postcolonial: The mind of apartheid. New York, NY: Routledge.
JARDINE, Alice. (1981). Introduction to Julia Kristeva’s “Women’s Time”. Signs, Chicago: The University of Chicago Press Books, 7(1), 5–12.
JONES, Rhys; PYKETT, Jessica; & WHITEHEAD, Mark. (2013). Changing behaviours: On the rise of the psycho- logical state. Cheltenham, UK: Edward Elgar.
KELLER, Richard C. (2007). Clinician and revolutionary: Frantz Fanon, biography, and the history of colo- nial medicine. Bulletin of the History of Medicine, 81(4), 823–841.
KHALFA, Jean. (2015). Fanon and psychiatry. Nottingham French Studies, 54(1), 52–71.
KHANNA, Ranjana. (2004). Dark continents: Psychoanalysis and colonialism. Durham, NC: Duke University Press.
_____. (2013). The lumpenproletariat, the subaltern, the mental asylum. The South Atlantic Quarterly, Durham: Duke University Press112(1), 129–143.
KOFFMAN, Ofra & GILL, Rosalind. (2013). The revolution will be led by a 12-year-old girl: Girl power and global biopolitics. Feminist Review, 105(1), 83–102.
KRISTEVA, Julia; JARDINE, Alice; & BLAKE, Harry. (1981). Women’s time. Signs, Chicago: The University of Chicago Press Books. 7(1), 13–35.
LITWACK, Scott D.; BECK, J. Gayle; & SLOAN, Denise M. (2015). Group treatment for trauma-related psycho- logical disorders. In U. Schnyder & M. Cloitre (Eds.), Evidence based treatments for trauma- related psychological disorders (pp. 433–448). New York, NY: Springer International.
MACEY, David. (2012). Frantz Fanon: A biography. London, UK: Verso.
MACHEREY, Pierre. (2012). Figures of interpellation in Althusser and Fanon. Radical Philosophy, 173, 9–20.
McCALL, Leslie. (2005). The complexity of intersectionality. Signs, Chicago: The University of Chicago Press Books. 30(3), 1771–1800.
McCLINTOCK, Anne. (1995). Imperial leather: Race, gender, and sexuality in the colonial contest. New York, NY: Routledge.
MENOZZI, Filippo. (2015). Fanon’s letter: Between psychiatry and anticolonial commitment. Interventions, Nova Iorque: Taylor & Francis Online. 17(3), 360–377.
MOJAB, Shahrzad. (2009). Imperialism, “post-war reconstruction” and Kurdish women’s NGOs. In N. Al-Ali & N. Pratt (Eds.), Women and war in the Middle East: Transnational perspectives (pp. 99–128). London, UK: Zed Press.
MURARAD, Numa. (2008). Psychothérapie institutionnelle à Blida [Institutional psychotherapy at Blida]. Tumultes, 31(2), 31–45. Retrieved from <www.cairn.info/revue-tumultes-2008-2-page-31.htm>.
OLIVER, Kelly. (2004). The colonization of psychic space: A psychoanalytic social theory of oppres- sion. Minneapolis: University of Minnesota Press.
_____. (2005). The good infection. Parallax, Leeds: Taylor & Francis Online. 11(3), 87–98.
PAINTER, Desmond. (2012). Occupy words: Language, commodification, and the (re)-appropriation of voice. The second Marxism and psychology conference, Morelia, Mexico.
PATEMAN, Carole. (1988). The sexual contract. Oxford, UK: Polity.
PICKETT, Brent L. (1996). Foucault and the politics of resistance. Polity, XX VIII(4), 445–466. PINAR, W. (2011). The character of curriculum studies. New York, NY: Palgrave Macmillan. PYKETT, J. (2012). The new maternal state: The gendered politics of governing through behavior change. Antipode, 44(1), 217–238.
RAIFORD, Leigh. (2009). Photography and the practices of critical black memory. History and Theory, 48(4), 112–129.
RAMAZANOGLU, Сaroline. (Ed.). (1993). Up against Foucault: Explorations of some tensions between Foucault and feminism. London, UK: Routledge.
RAZANAJAO, Claude L.; POSTEL, Jacques; & ALLEN, David F. (1996). The life and psychiatric work of Frantz Fanon. History of Psychiatry, 7, 499–524.
ROBERTS, Adrienne. (2015). Gender, financial deepening and the production of embodied finance: Towards a critical feminist analysis. Global Society, 29(1). Advance online publication. doi:10.1080/13600826.975189
ROWBOTHAM, S., Segal, L., & WAINWRIGHT, H. (2013). Beyond the fragments: Feminism and the making of socialism. London, UK: Merlin Press.
ROY, A. (2014). Subjects of risk: Technologies of gender in the making of millennial modernity. Public Culture, Nova Iorque: Duke University Press. 24(1), 131–155.
SCHEIDLINGER, S. (1994). An overview of nine decades of group psychotherapy. Psychiatric Services, Arlington: American Psychiatric Association Publishing. 45(3), 217–225.
_____. (2000). The group psychotherapy movement at the millennium: Some historical perspectives. International Journal of Group Psychotherapy, Nova Iorque: Taylor & Francis Online. 50(3), 315–339.
SCHEURICH, J., & McKENZIE, K. (2005). Foucault’s methodologies: Archaeology and genealogy. In N. DENZIN & Y. LINCOLN (Eds.), The SAGE handbook of qualitative research (pp. 141–169). Thousand Oaks, CA: Sage.
SCOTT, C. (1999). Spoken image: Photography and language. London, UK: Reaktion Books.
SHEPHERD, L. J. (2008). Gender, violence and security: Discourse as practice. London, UK: Zed Books.
SIKUADE, A. (2012). Fifty years after Frantz Fanon: Beyond diversity. Advances in Psychiatric Treatment, Londres: Royal College of Psychiatrists. 18(1), 25–31. Retrieved from <http://apt.rcpsych.org/content/18/1/25.full>.
SPIVAK, G. C. (1988). Can the subaltern speak. In C. Nelson & L. Grossman (Eds.), Marxism and the interpretation of culture (pp. 217–313). Urbana: University of Illinois Press.
STAUDT, K. (2010). Globalization and gender at border sites. In M. MARCHANT A. Sisson Runyan (Eds.), Gender and global restructuring: Sightings, sites and resistances (2nd ed., pp. 187–200). Abingdon, UK: Routledge.
STOLER, Ann Laura. (2002). Carnal knowledge and imperial rule. Berkeley: University of California Press.
THOMPSON, V. (2015, March). Using intersectionality? Using Marxism-Feminism? Paper presented at the conference The Strength of Critique: Trajectories of Marxism-Feminism panel, Rosa Luxemburg Stiftung, Berlin, Germany.
TURSHEN, Meredeth. (2002). Algerian women in the liberation struggle and the civil war: From active participants to passive victims? Social Research, Nova Iorque: John`s Hopkins University Press. 69(3), 889–911.
VAN SCHOOR, E. P. (2000). A sociohistorical view of group psychotherapy in the United States: The ideology of individualism and self-liberation. International Journal of Group Psychotherapy, Nova Iorque: Taylor & Francis Online. 50(4), 437–454. doi:10.1080/00207284.2000.11491023
VERGÈS, Françoise. (1996). The heritage of Frantz Fanon. The European Legacy, Tel Aviv: Taylor & Francis Online. 1(3), 994–998.
_____. (1997). Creole skin, Black mask: Fanon and disavowal. Critical Inquiry, Chicago: The University of Chicago Press. 23(3), 578–596.
WHITE, Aaronette M. (2014). All the men are fighting for freedom, all the women are mourning their men, but some of us carried guns: A raced-gendered analysis of Fanon’s psychological perspectives on war. Signs, Chicago: The University of Chicago Press Books. 40(1), 857–884.
WINKER, Gabriele, & DEGELE, Nina. (2011). Intersectionality as multi-level analysis: Dealing with social inequality. European Journal of Women’s Studies, Nova Iorque: SAGE Publications. 18(1), 51–66.
YUVAL-DAVIS, Nira. (1997). Gender & nation. London, UK: Sage.
Zamora, Daniel. (2015, December 10). Can we criticise Michel Foucault? Jacobin. Brooklyn, Nova Iorque. Retrieved from <www.jacobinmag.com/2014/12/foucault-interview/>
* Erica Burman é professora de educação no Manchester Institute of Education, School of Environment, Education and Development, University of Manchester no Reino Unido, Professora visitante no Centre for the Study of Migration and Society na University of Witwatersrand na África do Sul, Professora visitante no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo no Brasil, Professora visitante em Cibersomosaguas, Facultad de Ciencias Políticas y Sociología, Universidad Complutense de Madrid na Espanha; e professor adjunta no Institute of Social Work and Child Welfare em Oslo e Akershus University College na Noruega. Ela co-fundou o Discourse Unit (<http://www.discourseunit.com>), uma rede transinstitucional e transdisciplinar de pesquisa sobre reprodução e transformação da linguagem e subjetividade. Erica trabalha com psicologia crítica e educacional, teorias feministas, estudos sobre infância, e modelos de saúde mental em relação à violência. Seus trabalhos interrogam as relações que articulam indivíduo, desenvolvimento nacional e internacional, especialmente através do tropo da criança.
** Hugo Lana é psicanalista, graduado em psicologia (Mackenzie-SP) e em filosofia (USP), mestre em psicologia clínica (USP) e atualmente é doutorando em psicologia clínica (USP). É membro do Laboratório de Teoria Social, Filosofia e Psicanálise (LATESFIP/USP) e da Societé Internationale de Philosophie et Psychanalyse (SIPP/ISPP).
[1] Burman, 2008; Frosh, 2003; Frosh e Baraitser, 2008
[2] Fanon, F. (1963). The wretched of the earth (C. Farrington, Trans.). London, UK: Penguin. (Original work published 1961).
[3] Scheidlinger, S. (1994). An overview of nine decades of group psychotherapy. Psychiatric Services, 45(3), 217–225.
[4] Litwack, S. D., Beck, J. G., & Sloan, D. M. (2015). Group treatment for trauma related psycho- logical disorders. In U. Schnyder & M. Cloitre (Eds.), Evidence based treatments for trauma- related psychological disorders (pp. 433–448). New York, NY: Springer International.
[5] Uma busca no Google acadêmico utilizando o termo “psychoeducation” apresenta mais de 36.000 entradas, a maioria relacionada à educação de “esquizofrênicos” ou de pessoas com diagnósticos “bipolares” sobre sua condição, aderência ao tratamento por pessoas com abuso de substâncias e terapia com famílias ou jovens.
[6] Giordano, 2011; Khalfa, 2015; Khanna, 2013; Menozzi, 2015; Sikuade, 2012.
[7] De Vos, 2013; Jones, Pykett, e Whitehead, 2013; Pykett, 2012.
[8] Burman, 2008; Frosh e Baraitser, 2008.
[9] Rowbotham, S., Segal, L., & Wainwright, H. (2013). Beyond the fragments: Feminism and the making of socialism. London, UK: Merlin Press.
[10] Koffman e Gill, 2013; Roberts 2015; Roy, 2014.
[11] Zamora, D. (2015, December 10). Can we criticise Michel Foucault? Jacobin. Retrieved from <www.jacobinmag.com/2014/12/foucault-interview/>.
[12] Por exemplo, ver Foucault, M. (1980). Prison talk. In C. Gordon (Ed.), Power/knowledge: Selected interviews and other writings: 1972–1977 (pp. 37–54). Brighton, UK: Harvester, p. 52.
[13] Gates, H. L. (1991). Critical Fanonism. Critical Inquiry, Chicago: The University of Chicago Press. 17(3), 457–470.
[14] Fanon, F. (1965). A dying colonialism (H. Chevalier, Trans.). New York, NY: Grove Press. (Original work published 1959).
[15] Fanon, F. (1963). The wretched of the earth (C. Farrington, Trans.). London, UK: Penguin. (Original work published 1961).
[16] Pateman, C. (1988). The sexual contract. Oxford, UK: Polity.
[17] Yuval-Davis, N. (1997). Gender & nation. London, UK: Sage.
[18] Shepherd, L. J. (2008). Gender, violence and security: Discourse as practice. London, UK: Zed Books.
[19] Foucault, M. (1981). History of sexuality: Vol 1. An introduction. Harmondsworth, UK: Pelican.
[20] Foucault, M. (1988). Technologies of the self. In L. Martin, H. Gutman, & P. Hutton (Eds.), Technologies of the self: A seminar with Michel Foucault (pp. 16–49). London, UK: Tavistock.
[21] Por exemplo, Oliver, 2004; Stoler, 2002.
[22] Foucault, M. (1981). History of sexuality: Vol 1. An introduction. Harmondsworth, UK: Pelican, p. 94.
[23] Foucault, M. (1981). History of sexuality: Vol 1. An introduction. Harmondsworth, UK: Pelican, p. 95.
[24] Ibid, p. 96 (Trad. Nossa).
[25] Desai, M. U. (2014). Psychology, the psychological, and critical praxis: A phenomenologist reads Frantz Fanon. Theory & Psychology, Calgary, AB: SAGE Publications, 24, 58–75. doi:10.1177/0959354313511869
[26] Fanon, F. (1970). Black skin, white masks (C. L. Markmann, Trans.). London, UK: Paladin. (Original work published 1952).
[27]v Hook, D. (2005). A critical psychology of the postcolonial. Theory & Psychology, Calgary, AB: SAGE Publications, 15, 475–503. doi:10.1177/0959354305054748; e Hook, D. (2012). A critical psychology of the postcolonial: The mind of apartheid. New York, NY: Routledge.
[28] Oliver, K. (2004). The colonization of psychic space: A psychoanalytic social theory of oppression. Minneapolis: University of Minnesota Press.
[29] Oliver, K. (2005). The good infection. Parallax, 11(3), 87–98.
[30] Parece que Fanon não escreveu fisicamente o texto de PNMB, mas o ditou para sua esposa, Josie (Macey, 2012), a quem Sikuade (2012) descreve como uma “cigana corsega”. A significância disso, também em relação ao retrato de Fanon de relações sexuadas e de gênero através e pela racialização, ainda está para ser discutida.
[31] Fanon, F. (1970). Black skin, white masks (C. L. Markmann, Trans.). London, UK: Paladin. (Original work published 1952), p. 17.
[32] Ibid.
[33] Ibid.
[34] Haraway, 1988; Harding, 1987, 2004; Hekmanm 1997, 2010.
[35] Chamberlain, K. (2000). Methodolatry and qualitative health research. Journal of Health Psychology, 5(3), 285–296.
[36] Fanon, F. (1970). Black skin, white masks (C. L. Markmann, Trans.). London, UK: Paladin. (Original work published 1952), p. 11.
[37] Foucault, M. (2011). The order of discourse. In I. Parker (Ed.), Critical psychology: Critical concepts in psychology: Vol. 4. Dominant models of psychology and their limits (pp. 190–220). London, UK: Routledge. (Original work published 1970).
[38] Scheurich, J., & McKenzie, K. (2005). Foucault’s methodologies: Archaeology and genealogy. In N. Denzin & Y. Lincoln (Eds.), The SAGE handbook of qualitative research (pp. 141–169). Thousand Oaks, CA: Sage.
[39] Kristeva, J., Jardine, A., & Blake, H. (1981). Women’s time. Signs, Chicago: The University of Chicago Press Books. 7(1), 13–35.
[40] Jardine, A. (1981). Introduction to Julia Kristeva’s “Women’s Time”. Signs, Chicago: The University of Chicago Press Books. 7(1), 5–12, p. 5.
[41] Foucault, M. (1977). Language, counter-memory, practice: Selected essays and interviews (D. Bouchard, Ed.). Ithaca, NY: Cornell University Press, p. 230.
[42] Hartsock, 1990; Hekman, 1996; Pickett, 1996.
[43] Ferguson, K. E. (1991). Interpretation and genealogy in feminism. Signs, Chicago: The University of Chicago Press Books. 16(2), 322–229.
[44] Fanon, F. (1970). Black skin, white masks (C. L. Markmann, Trans.). London, UK: Paladin. (Original work published 1952), p. 12.
[45] Ibid.
[46] Ibid.
[47] Ver: Bell, V. (1993). Interrogating incest: Feminism, Foucault, and the law. London, UK: Taylor & Francis e Hartsock, N. (1990). Foucault on power: A theory for women? In L. Nicholson (Ed.), Feminism/postmodernism (pp. 157–175). New York, NY: Routledge.
[48] Diamond e Quinby, 1988; Fraser, 1989, 2003; Ramazanoglu, 1993.
[49] Bergner, G. (1995). Who is that masked woman? Or, the role of gender in Fanon’s Black Skin, White Masks. PMLA, 110(1), 75–88.
[50] Vergès, 1996, 1997; mas ver também Chow, 1999; Khanna, 2004.
[51] Haddour, A. (2010). Torture unveiled: Rereading Fanon and Bourdieu in the context of May 1958. Theory, Culture & Society, Londres: SAGE Publications, 27(7–8), 66–90. doi:10.1177/0263276410383710.
[52] Thompson, V. (2015, March). Using intersectionality? Using Marxism-Feminism? Paper presented at the conference The Strength of Critique: Trajectories of Marxism-Feminism panel, Rosa Luxemburg Stiftung, Berlin, Germany.
[53] Macherey, P. (2012). Figures of interpellation in Althusser and Fanon. Radical Philosophy, 173, 9–20.
[54] Fanon, F. (1970). Black skin, white masks (C. L. Markmann, Trans.). London, UK: Paladin. (Original work published 1952), p. 11.
[55] Ele tentou submeter PNMB como seu Doutorado Médico mas isso foi recusado (Macey, 2012). Para uma análise recente do texto que foi eventualmente aceito, ver Khalfa (2015).
[56] Por exemplo, ver: Keller, 2007; Khanna, 2013; Macey, 2012; Menozzi, 2015; Razanajao, Postel, e Allen, 1996; Sikuade, 2012.
[57] Macey, D. (2012). Frantz Fanon: A biography. London, UK: Verso.
[58] Murard, N. (2008). Psychothérapie institutionnelle à Blida [Institutional psychotherapy at Blida]. Tumultes, 31(2), 31–45. Retrieved from <http://www.cairn.info/revue-tumultes-2008-2-page-31.htm>.
[59] Ver Harrison, T. (2000). Bion, Rickman, Foulkes, and the Northfield experiments: Advancing on a different front. London, UK: Jessica Kingsley.
[60] Scheidlinger, S. (2000). The group psychotherapy movement at the millennium: Some historical perspectives. International Journal of Group Psychotherapy, 50(3), 315–339.
[61] Gibson, N. C. (2013). A wholly other time? Fanon, the revolutionary, and the question of organiza- tion. South Atlantic Quarterly, 112(1), 39–55.
[62] Macey (2012) discute como os esforços de Fanon para lidar com uma situação crescentemente não-manejável como um terapeuta/médico ao manter a confidencialidade médico-paciente e suas tentativas de usar sua situação de destaque para propor negociações aumentou as ameaças de morte e afirmações de que a demissão e a subsequente expulsão quase certamente salvaram sua vida.
[63] Como é bem conhecido, esse texto foi banido na França e em muitos outros países, alegadamente por sua incitação à violência, mas disputadamente isso se deveu à análise provida por Jean-Paul Sartre em seu Prefácio em vez do próprio texto de Fanon (ver discussão em Macey, 2012).
[64] Fanon, F. (1963). The wretched of the earth (C. Farrington, Trans.). London, UK: Penguin. (Original work published 1961), p. 200.
[65] Macey, D. (2012). Frantz Fanon: A biography. London, UK: Verso.
[66] Fanon, F. (1963). The wretched of the earth (C. Farrington, Trans.). London, UK: Penguin. (Original work published 1961), p. 201.
[67] _____. (1970). Black skin, white masks (C. L. Markmann, Trans.). London, UK: Paladin. (Original work published 1952), p. 11.
[68] _____. (1963). The wretched of the earth (C. Farrington, Trans.). London, UK: Penguin. (Original work published 1961), p. 200; em seus termos.
[69] Fanon, F. (1963). The wretched of the earth (C. Farrington, Trans.). London, UK: Penguin. (Original work published 1961), p. 248.
[70] Ecoando o relato de Fanon, isso foi vivamente e brilhantemente apresentado no filme Divine Intervention de Elia Suleiman (Balsan e Suleiman, 2002), com vizinhos em uma cidade de West Bank na Palestina ocupada por Israel em conflito um com o outro por onde o lixo seria colocado na rua para a coleta.
[71] Ver Chase e Walker, 2013.
[72] Fanon, F. (1963). The wretched of the earth (C. Farrington, Trans.). London, UK: Penguin. (Original work published 1961), p. 237.
[73] Ibid., p. 201.
[74] Ibid., p. 202.
[75] Ibid.
[76] A série A tem cinco casos “do tipo reacionário” (Fanon, 1961/1963, p.204); A série B se dirige a casos refletindo/surgindo da “atmosfera de guerra total que reina na Argélia” (p.217), que inclui cinco casos, incluindo o caso largamente discutido dos dois meninos que mataram seu amigo europeu “porque os europeus querem matar todos os árabes. Nós não podemos matar pessoas grandes, mas nós pudemos matar aqueles que nem ele” (p.2017-2018). A série C documenta casos de transtorno psicológico após tortura (na qual ele também nota os números de casos encontrados), que são então organizados em torno dos impactos de formas particulares de tortura (eletricidade, “soro da verdade”, lavagem cerebral – a última subdividida em efeitos nos “intelectuais” e “não-intelectuais”). A série D trata de “desordens psicossomáticas de úlceras, cólica, problemas menstruais de mulheres, rigidez muscular, cabelos brancos, insônia, etc. A seção final discute a suposta “criminalidade” do argeliano, não somente como um mito racista mas como “experenciado no nível narcisístico como uma manifestação de virilidade autêntica, e [em vez disso] coloca o problema no nível de história colonial” (p.246).
[77] Fanon, F. (1963). The wretched of the earth (C. Farrington, Trans.). London, UK: Penguin. (Original work published 1961), p. 204.
[78] Ibid., p. 205-206.
[79] Ibid., p. 206.
[80] Ibid.
[81] Ibid.
[82] Ibid.
[83] Ibid.
[84] Ibid.
[85] Ibid., p. 204.
[86] Ibid., p. 206-207.
[87] Ibid., p. 207.
[88] Ibid.
[89] Edelman, L. (2004). No future. Durham, NC: Duke University Press.
[90] Fanon, F. (1963). The wretched of the earth (C. Farrington, Trans.). London, UK: Penguin. (Original work published 1961), p. 204.
[91] McClintock, A. (1995). Imperial leather: Race, gender, and sexuality in the colonial contest. New York, NY: Routledge.
[92] Esse não é o único exemplo que Fanon provê – ver capítulo “The voice of Algeria” sobre as mudanças e significações ambíguas realizadas pela rádio em A Dying Colonialism (1959/1965). Ver também Painter (2012).
[93] Raiford, L. (2009). Photography and the practices of critical black memory. History and Theory, 48(4), 112–129.
[94] Fanon, F. (1963). The wretched of the earth (C. Farrington, Trans.). London, UK: Penguin. (Original work published 1961), p. 206.
[95] Ibid.
[96] Barthes, R. (1981). Camera lucida: Reflections on photography. New York, NY: Macmillan.
[97] Scott, C. (1999). Spoken image: Photography and language. London, UK: Reaktion Books, p. 24.
[98] Ibid.
[99] Nem está indicado qual a idade de sua esposa quando eles se casaram, embora esteja sugerido pela designação de sua mulher como uma “menina”, junto ao fato de ser um casal arranjado por ambos os casais de pais, e a idade atual de B- relatada por Fanon como tendo somente 26 anos, que isso pudesse, em contextos atuais, ser interpretado como um casamento prematuro.
[100] Fanon, F. (1963). The wretched of the earth (C. Farrington, Trans.). London, UK: Penguin. (Original work published 1961), p. 207.
[101] Ibid., p. 204.
[102] Ibid., p. 205.
[103] Crowe, K. (2015). Sexual assault and testimony: Articulation of/as violence. Law, Culture and the Humanities. Advance online publication. doi: 1743872115577917.
[104] Fanon, F. (1963). The wretched of the earth (C. Farrington, Trans.). London, UK: Penguin. (Original work published 1961), p. 207.
[105] Ibid.
[106] Ibid.
[107] Ibid.
[108] Spivak, G. C. (1988). Can the subaltern speak. In C. Nelson & L. Grossman (Eds.), Marxism and the interpretation of culture (pp. 217–313). Urbana: University of Illinois Press.
[109] Fanon, F. (1963). The wretched of the earth (C. Farrington, Trans.). London, UK: Penguin. (Original work published 1961), p. 207.
[110] Ibid., p. 206.
[111] Ibid.
[112] Isso é no que a pequena literatura que cita esse caso parece concentrar (por exemplo, Holmstrom e Burgess, 1979).
[113] Notem que Freire (1972) se apoiou extensivamente nos escritos de Fanon.
[114] Fanon, F. (1963). The wretched of the earth (C. Farrington, Trans.). London, UK: Penguin. (Original work published 1961), p. 246.
[115] Ibid., p. 207.
[116] Ibid.
[117] Abordando alguns – aparentemente inúteis – usos de medicamento no começo que meramente aumentavam a preocupação acerca do estado agitado do homem.
[118] Ibid., p. 206.
[119] Ibid., p. 208.
[120] Ibid., p. 202.
[121] Foulkes, S. H., & Anthony, E. (1957). Group psychotherapy: The psychoanalytic approach. Harmondsworth, UK: Pelican, p. 259-260.
[122] Burman, E. (2015). Fanon’s Lacan and the traumatogenic child: Psychoanalytic reflections on the dynamics of colonialism and racism. Theory, Culture & Society. Londres: SAGE Publications, Advance online publication. doi:10.1177/0263276415598627.
[123] Fanon, F. (1963). The wretched of the earth (C. Farrington, Trans.). London, UK: Penguin. (Original work published 1961), p. 208.
[124] Vale também notar que as primeira clínicas psicanalíticas grátis abriram nos anos 1920-1930 em Berlim e Viena não somente eram jovens de classe trabalhadora que compunham a maior proporção dos pacientes, mas também eles apresentavam problemas concernentes à potencial sexual (Danto, 2005). Dado o contexto político volátil, a possiblidade assim como – o que viria a ser – fascismo e repressão, um relato psicopolítico assim como psicobiográfico é, discutivelmente, tão relevante para isso quanto para o relato de Fanon aqui.
[125] Ibid.
[126] Haddour, 2010; Turshen, 2002; White, 2014.
[127] Cockburn, 2013; Mojab, 2009; ver também Staudt, 2010.
[128] Benjamin, W. (1969). Illuminations: Essays and reflections. New York, NY: Schocken.
[129] Fanon, F. (1965). A dying colonialism (H. Chevalier, Trans.). New York, NY: Grove Press. (Original work published 1959).
[130] White, A. M. (2014). All the men are fighting for freedom, all the women are mourning their men, but some of us carried guns: A raced-gendered analysis of Fanon’s psychological perspectives on war. Signs, Chicago: The University of Chicago Press Books. 40(1), 857–884, p. 860.
[131] Fanon, F. (1963). The wretched of the earth (C. Farrington, Trans.). London, UK: Penguin. (Original work published 1961), p. 247.
[132] Ibid., p. 250.
[133] Ibid., p. 222.
[134] Ibid., p. 223.
[135] Ibid., p. 222.
[136] Ibid., p. 223.
[137] Ibid.
[138] Gaztambide-Fernández, 2010; Pinar, 2011.
[139] McCall, 2005; Winker & Degele, 2011.
[140] Butler, J. (1997). The psychic life of power: Theories in subjection. New York, NY: Stanford University Press.